Trinta e seis dias marcados por diplomacia, logísticas complexas e articulações diante de um cenário de crise internacional. Horas de atuação de um time de embaixadores, diplomatas, funcionários de representações consulares, pilotos, comandantes, especialistas em logística, profissionais da área médica e de saúde mental e montagem de estrutura de acolhimento sob comando da Presidência da República.
O que fizemos, de buscar a nossa gente lá, é para dizer o seguinte: ‘Ninguém larga a mão de ninguém nesse país’. Qualquer brasileiro que estiver dentro da área de guerra, que precisar voltar, nós não mediremos esforços. Esse é o papel do Brasil no mundo”. (Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República).
Montada pelo governo brasileiro para repatriar cidadãos na zona do conflito iniciado em 7 de outubro, no Oriente Médio, a Operação Voltando em Paz viveu, neste 12 de novembro, mais um capítulo importante de sua trajetória, quando o grupo de brasileiros que ansiava por deixar a Faixa de Gaza cruzou a fronteira com o Egito.
“Chegamos finalmente ao Egito com o apoio do Brasil”, celebrou Hasan Rabee, em post na rede social X (antigo Twitter). “Obrigado ao Governo Federal, obrigado presidente, embaixadores, equipe da Embaixada no Egito e em Ramala, nesse grande esforço para nos retirar de lá”, prosseguiu, em vídeo postado pelo canal do Itamaraty.
A previsão é de que eles embarquem nesta segunda-feira, 13/11, em um avião VC2, da Presidência da República, na décima viagem de repatriação de brasileiros. A chegada está prevista para as 23h30 desta segunda, na Base Aérea de Brasília. Ao tocar o solo, serão 1.477 passageiros transportados: 1.462 brasileiros, 11 palestinos, três bolivianas e uma jordaniana, além de 53 animais domésticos (veja abaixo).
Nove incluídos
Eram 19h12 de 10 de outubro, no horário local de Tel Aviv, quando uma aeronave KC-30, um Airbus A330 200 da Força Aérea Brasileira (FAB), decolou da capital israelense levando 211 brasileiros. Aquele voo, que pousou por volta das 4h10 de 11 de outubro em Brasília, marcou a primeira missão da Operação Voltando em Paz. “Saímos de Tel Aviv debaixo de mísseis e chegamos ao Brasil com aplausos. A nossa esperança é olhar para o céu e saber que não cairão bombas”, disse, aliviado, o escritor e empresário brasiliense Fabrício Ramon Lopes, que fez parte do primeiro voo da Operação Voltando em Paz a pousar no Brasil.
Resposta imediata
O mundo ainda assimilava o choque dos atentados cometidos contra Israel no sábado, 7 de outubro, quando o Governo Brasileiro deu início à mobilização para estruturar como a resposta para a retirada dos brasileiros da zona de conflito. No mesmo dia dos ataques, foi montado um gabinete de crise e, uma vez acionadas, as embaixadas do Brasil em Tel Aviv (Israel), do Cairo (Egito) e o Escritório de Representação em Ramala (na Palestina) deram início à operação diplomática para identificar quem eram e onde estavam os brasileiros na região conflagrada. Em paralelo, a Força Aérea Brasileira era acionada para garantir que as aeronaves pudessem resgar os cidadãos nacionais no mais breve prazo possível.
Critérios
Por meio de formulário online, cerca de 2,7 mil manifestaram interesse em retornar ao Brasil. Aqueles que não conseguiram lugares em voos de companhias aéreas privadas passaram a ser atendidos pela Operação Voltando em Paz, seguindo requisitos de prioridade para brasileiros sem passagens, não residentes, gestantes, idosos, mulheres e crianças. Até especialistas do Ministério da Agricultura foram envolvidos para garantir o repatriamento de animais domésticos. “O que fizemos, de buscar a nossa gente lá, é para dizer o seguinte: ‘Ninguém larga a mão de ninguém nesse país’. Qualquer brasileiro que estiver dentro da área de guerra, que precisar voltar, nós não mediremos esforços. Esse é o papel do Brasil no mundo.”, afirmou o presidente Lula, um dia depois do sucesso da oitava missão.
Cisjordânia
A quinta-feira, 2 de novembro, marcou uma nova etapa da operação. Naquela data, uma aeronave VC-2 (Embraer 190), cedida pela Presidência, tocou o solo na Base Aérea de Recife (PE). A bordo, 32 repatriados da Cisjordânia. A Representação Brasileira em Ramala organizou uma complexa operação de resgate de 12 famílias. Eram 12 homens, 9 mulheres e 11 crianças, com seis idosos, dois deles cadeirantes. Eles foram levados em três veículos alugados pela representação e conduzidos de 11 cidades da Cisjordânia até Jericó, onde fizeram os trâmites migratórios. Então, amparados pela missão brasileira, cruzaram a fronteira com a Jordânia, seguiram para a capital Amã, e de lá decolaram para o Brasil. “Quero paz. Para se locomover de uma região para outra estava bem difícil lá, com pessoas armadas”, frisou Amer Aziz, que retornou com quatro filhos.
Acolhimento
Na chegada ao Brasil do voo com os repatriados de Gaza, o Governo Federal já tem uma operação de acolhimento montada. Em complemento ao apoio de suas famílias, eles terão à disposição serviços de abrigo, documentação e alimentação, além de apoio psicológico, cuidados médicos e imunização. Ficarão dois dias hospedados em Brasília. “Alguns brasileiros já têm destino certo porque têm familiares aqui, então serão deslocados para esses locais. Uma parcela significativa, quase a metade do grupo, não tem onde ficar, mas o Governo Federal já disponibilizou, através do Ministério do Desenvolvimento Social, um local onde essas pessoas ficarão acolhidas. Vai ser no interior de São Paulo”, afirmou Augusto de Arruda Botelho, secretário nacional de Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Ajuda Humanitária
A Operação Voltando em Paz não foi marcada apenas por missões de resgate. Além dos voos de repatriação, duas aeronaves da Presidência levaram à região de conflito alimentos, insumos médicos e purificadores de água. Em 18 de outubro, um VC-2 pousou no Egito com equipamentos de filtragem de água e kits de saúde. A carga continha 40 purificadores de água com capacidade de tratar mais de 220 mil litros por dia. Com tecnologia e fabricação brasileiras, os equipamentos são capazes de remover 100% de vírus e bactérias da água. O acesso à água potável é uma das maiores dificuldades enfrentadas hoje pela população da Faixa de Gaza.
Naquele dia, também foram desembarcados dois kits de saúde. Cada um atende até 3 mil pessoas ao longo de um mês e são compostos por medicamentos e insumos, como anti-inflamatórios, analgésicos, antibióticos, além de luvas e seringas. Ao todo, cada kit continha 48 itens, com um total de 267 quilos de materiais. Em 2 de outubro, um outro VC-2 da Presidência da República pousou no Aeroporto Internacional de Al-Arish, Egito, levando na bagagem 1,5 tonelada de alimentos – arroz, açúcar, derivados de milho e leite – destinados à população da Faixa de Gaza, oferecidos pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), em uma nova ação de ajuda humanitária do governo brasileiro aos palestinos.