Com o pedido do ministro André Mendonça, o Superior Tribunal Federal (STF) suspendeu o julgamento que definirá se o governo federal poderá quitar precatórios até 2026. De acordo com Ernesto Schlesinger, especialista em finanças e sócio fundador da Jequitibá Investimentos, a suspensão do julgamento não é uma boa notícia para os credores desses títulos e nem para o governo, que deve ver a “bola de neve” se transformar em uma “bomba fiscal” que explodirá ao final do mandato atual. “A conta dos precatórios está no caminho de se tornar incontrolável e o governo não parece estar conduzindo o assunto com a seriedade que deveria. Estão todos aguardando a decisão do STF, porém, com o pedido de vista do ministro André Mendonça, a decisão sobre o assunto deve ficar só para 2024. O que os números mostram é que a situação está se agravando rapidamente e pode chegar a um ponto sem retorno, lesando milhões de brasileiros que têm o legítimo direito de receber por suas causas ganhas contra o Estado”, analisa Ernesto Schlesinger, especialista em finanças e sócio fundador da Jequitibá Investimentos.
Estudo mostra que credores podem ter de esperar 12 anos a mais para receber precatórios da União
A “bomba fiscal” dos precatórios, gerada pela PEC aprovada em 2021, pode aumentar em 12 anos o prazo para os credores receberem seus direitos. Essa é a conclusão de um levantamento realizado pela Jequitibá Investimentos, empresa especializada em ativos judiciais, que calculou — com base em números do Conselho Nacional de Justiça — quais serão os efeitos da “bola de neve” que está se formando na dívida pública pela limitação do pagamento de precatórios da União até o fim de 2026, regra imposta pela emenda constitucional. Segundo um estudo da Instituição Fiscal Independente, órgão vinculado ao Senado, a conta acumulada para 2027 pode ultrapassar os R$ 700 bilhões, valor equivalente a 2% do PIB.
De acordo com o levantamento da Jequitibá Investimentos, considerando que nesses quatro anos o governo seguiria pagando menos precatórios do que emite, o acúmulo poderia fazer a fila de credores praticamente dobrar e a espera de recebimento aumentar de uma média de 18 anos, atualmente, para mais de 30.
Ano | Montante da dívida | Prazo médio para recebimento |
2022 | R$ 273,6 bilhões* | 15 a 18 anos |
2027 | R$ 850 bilhões** | 25 a 30 anos |
*Fonte: Conselho Nacional de Justiça
**Fonte: Instituição Fiscal Independente
O que os credores podem fazer?
A PEC de 2021 estabeleceu que os precatórios poderiam ser utilizados para diversas finalidades, como pagamento de impostos, débitos inscritos na dívida ativa ou até para aquisição de imóveis do setor público ou compra de ações. Contudo, o texto constitucional também estabelece que o advogado-geral da União, o procurador-geral da Fazenda Nacional e o ministro da Economia devem contribuir com a regulamentação, apontando os casos específicos para essa “utilização alternativa”, o que ainda não saiu do papel.
Enquanto essa regulamentação não sai, para quem não quer (ou não pode) esperar, um caminho possível é antecipar o recebimento, vendendo o precatório para empresas especializadas, que pagam os credores à vista em troca da cobrança do deságio, que é uma porcentagem sobre o valor do título. Quem tem um precatório de R$ 100 mil para receber daqui 10 anos, por exemplo, pode negociá-lo agora aplicando-se um deságio por conta do tempo e dos riscos. Esse deságio varia, em média, entre 45% a 55%. Se considerarmos os fatores liquidez, risco e rentabilidade, a decisão de antecipar esse recebimento pode fazer muito sentido.
Ernesto destaca que a opção de antecipar ou não deve ser estudada e que a decisão deve envolver diversos fatores, incluindo a necessidade que a pessoa tem de contar com o dinheiro naquele momento. “Uma pesquisa recente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) mostrou que 80% das famílias brasileiras estão endividadas, principalmente com cartão de crédito e cheque especial, modalidades de crédito que chegam a cobrar 400% ao ano em juros por atraso. Para quem está passando por esse drama e precisa colocar ordem na vida financeira, contar com aquele dinheiro que hoje está parado pode ser uma solução”, explica o especialista, que destaca que idade e saúde do credor também são fatores a serem levados em consideração.
“Infelizmente são comuns os casos em que o credor não vive o suficiente para receber e o precatório fica como herança para os filhos e netos. Se essa é a vontade da pessoa, ótimo, mas muitas vezes o idoso está em dificuldades financeiras, por gastos com médicos e remédios, ou até deixou de realizar algum sonho por não ter tido oportunidade financeira, sem saber que poderia ter antecipado seu direito de receber e vivido a velhice de forma mais confortável”, destaca Ernesto.