Os estudantes aprendem e aplicam a teoria nos hospitais da capital
“Desde pequeno, eu via o descaso com os pacientes e no atendimento na rede pública. Sentia que faltava algo, que poderia fazer melhor. Isso me influencia muito.” A afirmação é de Abel Costa, 25 anos. Ele cursa o quinto período de medicina na Escola Superior de Ciências da Saúde (Escs), entidade ligada à Secretaria de Saúde. Ele e oito colegas fazem parte do grupo que circula nos corredores do Hospital Regional de Taguatinga (HRT). Como eles, há outros 507 estudantes de medicina e 261 de enfermagem inseridos no sistema de saúde público para aprender a clinicar. O objetivo, além de formar profissionais, é fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) e a atenção primária.
Eles nadam contra a corrente. Os graves problemas estruturais dos hospitais públicos, como a falta de insumos e medicamentos e o sucateamento dos equipamentos das unidades, afastam os novos profissionais. Em 2014, dos 488 médicos aprovados e convocados, 285 se recusaram a assumir a vaga. No ano passado, o número de desistências foi maior: das 1.242 nomeações, 311 pessoas não tomaram posse. Isso significa que 25% dos aprovados no último concurso abriram mão do serviço público.
Para interromper o processo de desidratação do sistema de saúde, a Escs fomenta aspectos ético, moral e de organização do serviço público. Diferentemente das escolas tradicionais, os estudantes são imersos desde o primeiro ano de curso na realidade dos pacientes e da estrutura do governo. “Somos mais humanos, amigos. Sabemos como tratar um paciente. Começamos a aprender que não basta só medicar; é preciso conversar, entender. Isso é muito positivo”, explica o futuro médico Abel.
“Tentamos formar um médico com uma visão mais abrangente, humana e inclinados a permanecerem na rede pública. Boa parte dos novos profissionais prefere virar especialista para ter uma projeção profissional e alta remuneração. Os nossos alunos saem compreendendo a importância do SUS para a cidadania”, explica o cardiologista Paulo Roberto Silva, diretor da Escs.
A preocupação de Paulo Roberto vem das estatísticas. Hoje, a capital federal ocupa posição crítica entre as 27 capitais no ranking que mede a cobertura da atenção primária. Dados do Ministério da Saúde mostram que apenas 27% da população têm acesso ao serviço. Andressa Lorrana de Jesus, 20 anos, cursa enfermagem há três anos e acredita que, nos próximos anos, o cenário pode estar diferente. “A nossa escola é formada pelo SUS e para o SUS. Desde sempre, a gente está em contato com a comunidade. Faço visitas domiciliares com o foco na atenção primária. A saúde encontra-se num processo fragilizado e vulnerável no qual somos a diferença”, conclui.