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25 nov 2024 02:01


“Saúde não é negócio”: Jofran Frejat resgata artigo de 2009 em que questiona Organizações Sociais

Após sete anos artigo de Frejat demonstra que mudam os gestores, mas os problemas e as soluções equivocadas, permanecem

Por Kleber Karpov

Política Distrital conversou com o médico, ex-deputado federal e ex-secretário de Saúde do DF Jofran Frejat que, por quatro vezes, esteve à frente da Secretaria de Estado de Saúde do DF (SES-DF), duas na gestão do ex-governador, Joaquim Roriz. Frejat , e  Também que disputou as eleições de 2014 com o governador, Rodrigo Rollemberg (PSB) é considerado, quase por unanimidade entre os servidores da Secretaria de Estado de Saúde do DF (SES-DF), o melhor gestor que já passou pela Pasta.

O intuito o contato de Política Distrital era saber a avaliação em relação à decisão por parte do governador Rodrigo Rollemberg (PSB), em instalar Organizações Sociais (OSs) na gestão da Saúde do DF. Reservado, Frejat afirmou ser leitor assíduo do Blog, pouco tem se pronunciado sobre os acontecimentos políticos da atual gestão, por evitar dar entrevistas.

No entanto o ex-Secretário de Saúde sugeriu que o Blog extraísse a opinião do artigo “Saúde não é negócio”, publicado no Jornal de Brasília em  12 de Março de 2009.

Antes, porém…

Em relação às OSs uma das poucas manifestações de Frejat aconteceu em 5 de outubro de 2015. Isso durante uma sessão solene organizada pela presidente da Câmara Legislativa do DF (CLDF), deputada Celina Leão (então PDT atual PPS) e pelo distrital, Bispo Renato Andrade (PR), em homenagem ao Dia do Médico (5/Nov). Na ocasião Frejat foi enfático.

“Vale aqui uma observação já que nos encontramos em um momento que merece atenção. A quem serve a visível precarização do sistema público de saúde. Através deles que os pobres têm a chance de acesso aos serviços de saúde. Não só os preventivos como os de maior complexidade, como os transplantes, implantes, cirurgias cardíacas, medicamentos de alto custo. Quando no passado esses pobres tiveram acesso a esses procedimentos?

A leitura para esse tipo de atitude é que além de driblar a Lei de Responsabilidade Fiscal dá ao seu servidor público o rótulo de incompetente e incapaz de oferecer e prestar bons serviços. A própria história dos serviços públicos de saúde de Brasília desmente essa premissa.

Como explicar, por exemplo, que foram competentes, em passado recente, e hoje não mais o são? Onde está o algoz, nos servidores ou na gerência? A solução seguramente não passa pela entrega ao setor privado ou a terceiros. 

Nós, que fomos modelo e exemplo, copiado, precisamos copiar outros modelos e eficiência duvidosa?  Será que hospitais terceirizados vão atender além da sua capacidade colocando pacientes graves em macas nos corredores das emergências ou vão permanecer bonitinhos e arrumadinhos transferindo-os para os hospitais públicos que não os pode recusar? Alguém acredita que uma organização privada, social, ou não, dispõe a administrar um hospital sem perspectivas de lucro? Aos que tem dúvidas perguntem-se, se essas organizações se envolve com medicina preventiva, vacinações, etc. Não dá retorno imediato!

O lucro está nos procedimentos de hospitalares de alta e média complexidade. Esse sim tem resposta financeira e notoriedade. É a exploração do filão do velho adagio popular que só se dá valor a saúde quando se perde. Prevenir? Isso é função do estado! 

E como será o futuro dos funcionários efetivos? Serão paulatinamente substituídos por celetistas? Terão os seus salários congelados no tempo como no velho Inamps [ Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social]? E os novos serão as vantagens adquiridas as duras penas, como carga horária e outras? Deixo ao pensamento dos meus colegas e nas mãos de vossas excelências, deputados, essas considerações.”.

Mas e o artigo de Frejat?

Embora Política Distrital, tenha replicado, em outubro de 2015 o artigo sugerido por Jofran Frejat, após sete anos, o texto permanece atualizadíssimo e vale a pena um releitura.

“Saúde não é negócio”

por Jofran Frejat

Em 1979 foi iniciado o Plano de Assistência à Saúde no Distrito Federal que estabelecia o princípio da universalização, regionalização e hierarquização dos serviços públicos de saúde. Posto em prática com a construção de centros e postos de saúde, hospitais e serviços correlatos, distribuídos uniformemente de acordo com a densidade populacional, ofereceu resultados surpreendentes. Profissionais engajados na nova sistemática, além da novidade da ação dos recém-criados agentes de saúde junto à comunidade, proporcionaram, não só  facilidade ao atendimento, como resposta epidemiológica expressiva.  Para ter-se uma ideia, a mortalidade infantil na cidade satélite  de Ceilândia, então com 300.000 habitantes, que era de 100 crianças, no primeiro ano de vida, em cada 1000 nascidas vivas, caiu para 30 em pouco mais de dois anos. Eram 70 bebês salvos a cada ano, só em Ceilândia.

Os novos hospitais, a reforma dos antigos, o hemocentro, o hospital de apoio, novos equipamentos, os bons serviços de emergência, UTIs e transplantes transformaram a rede pública de saúde do DF não só em referência, mas também em preferência dos seus habitantes. E, por via de conseqüência, dos que aqui  não habitavam. Não era incomum ouvir-se, até mesmo de médicos: “se eu tiver algum acidente me levem para o Hospital de Base”. Ou de uma gestante: ”se eu entrar em trabalho de parto me leve para o HRAS (HMIB)”. Até então pouco se falava em Planos de Saúde, Seguro Saúde, etc. A rede pública absorvia a demanda. Os hospitais particulares patinavam no atendimento a apenas alguns.

O sistema de atendimento implantado no DF foi legitimado na nossa Carta Constitucional de 1988 com a criação do Sistema  Único de Saúde (SUS).  Era modelo e serviu de exemplo.

Não resta dúvida que o SUS foi e tem sido o maior plano de inclusão social que esse país já viu. Maior mesmo que o bolsa-família que se restringe às famílias de baixa renda. Mas, da mesma forma como o de Brasília, todo plano pronto e acabado envelhece precocemente. O tempo e a demanda estão em permanente mudança. É preciso, pois, acompanhá-los.  A paralisia diante da crença de uma rede de atendimento satisfatória em determinado momento,  conduz à suspensão de sua ampliação e modernização e, consequentemente, ao seu descrédito.  Assim  os planos privados vão ocupando os espaços vazios. Basta olhar o crescimento dessa  alternativa. Aliás, nem sei bem se a palavra apropriada é alternativa ou necessidade. Além de, naturalmente, representar um falso “status”.

Tem solução? Mas é claro que tem! É difícil erguer uma boa reputação. Mais difícil, ainda, recuperá-la.  A solução, entretanto, seguramente não passa pela entrega, ao setor privado ou a terceiros, a gerência dos serviços de saúde.  A leitura para esse tipo de atitude é de que, além de driblar a lei de responsabilidade fiscal, dá-se, ao servidor público, o rótulo de incompetente, incapaz de oferecer e prestar bons serviços. A própria história dos serviços públicos de saúde de Brasília desmente essa premissa. Como explicar, por exemplo, que  foram competentes em passado recente e  hoje não mais o são? Onde está o nó górdio? Nos servidores ou na gerência?  Nós que fomos modelo e exemplo copiado, precisamos copiar outros modelos de eficiência duvidosa? Será que hospitais terceirizados vão atender além de sua capacidade, colocando pacientes graves em macas nos corredores das emergências, ou vão permanecer bonitinhos e arrumadinhos, transferindo-os para os hospitais públicos que não os pode recusar? Alguém acredita que uma organização privada, social ou  não, dispõe-se a administrar um hospital sem perspectiva de lucro? Aos que têm dúvida perguntem-se se essas organizações se envolvem com a medicina preventiva (vacinação, etc.) que não dá retorno imediato. O lucro está nos procedimentos hospitalares de média e alta complexidade. Esses, sim, dão resposta financeira e notoriedade. É a exploração do filão do velho adágio popular de que só se dá valor à saúde, quando se perde. Prevenir? Isso é função do Estado! Ora bolas! Nem mesmo os hospitais mais famosos, eficientes e ricos abrem mão do título de filantrópicos cujo objetivo é escapar do desconto patronal à combalida Previdência.

Vivemos em uma sociedade em que as pessoas se mostram cada vez mais egoístas. O lema é mais ou menos o seguinte: “eu me dando bem o resto que se dane”. Com certeza, aqueles que conseguirem se internar no hospital “arrumadinho” irão elogiar a hotelaria. Mais vale a aparência que o conteúdo. É o esvaziamento do princípio da universalização do atendimento instituído pelo SUS.

O Sistema Único de Saúde, durante os seus pouco mais de 20 anos de existência, vem sendo sorrateiramente desconstruído, até mesmo por alguns que empunharam a sua bandeira. Tendo se mostrado socialmente inclusivo a crítica frontal tornou-se insustentável.  Aos poucos foram apontando os percalços do plano que engatinhava. Paulatina e repetidamente divulgam os gargalos no acesso aos serviços de saúde, ignorando os milhões de brasileiros que até então não dispunham de qualquer atendimento e que passaram a tê-lo, aumentando, extraordinàriamente, a demanda. É a tentativa de comer pelas beiradas. Minar as esperanças dos antigos excluídos e desacreditar o Sistema aos que dispõem de meios para alternativas.

A quem serve a precarização  do sistema de saúde público? É através  dele que os pobres têm a chance de acesso aos serviços de saúde; não só os preventivos como os de maior complexidade, tais como transplantes, implantes, cirurgias cardíacas, medicamentos de alto custo. Quando no passado eles tiveram acesso a esses procedimentos?

Minar o SUS da forma sub-reptícia como tem sido feito, proclamando apenas suas mazelas – em geral decorrente do extraordinário aumento da demanda – sem o reconhecimento do grande êxito de que se reveste, é um desserviço à população mais pobre e um bom serviço prestado aos que fazem da doença um bom negócio.

Jofran Frejat, médico, ex-secretário de Saúde do DF,
ex-deputado federal, ex-candidato ao governo do DF pelo PR

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