Por Ian Ferraz e Jak Spies
Com a disputa dos Jogos Paralímpicos Paris 2024, o olhar do brasileiro se volta, mais uma vez, para as práticas esportivas. A cada competição e medalha conquistada, a vibração toma conta das pessoas. No entanto, para que isso seja possível, há sempre um longo caminho a ser percorrido. Em qualquer esporte, o campeão surge da base – e, aqui na capital, o Governo do Distrito Federal (GDF) tem trabalhado para fortalecer a oferta de modalidades paralímpicas.
Este trabalho envolve a Secretaria de Educação (SEEDF), que opera sete unidades do Centro de Iniciação Paradesportiva (CIDPs), e a Secretaria de Esporte e Lazer (SEL-DF), com seus 12 centros olímpicos e paralímpicos (COPs). Nos CIDPs, mais de 180 alunos praticam atletismo adaptado, futebol de 5, goalball, parabadminton, basquetebol, futebol PC, judô, tênis de mesa, bocha, futsal, natação, tênis em cadeira de rodas e vôlei sentado. Os COPs atendem mais de 2 mil alunos, oferecendo atividades como atletismo, bocha, goalball, parabadminton, natação, hidroginástica e diversas modalidades de estimulação.
Em cada um desses espaços, não faltam histórias de superação e de conquistas pessoais e esportivas. Professor de parabadminton e natação, Letisson Samarone leciona no CID paralímpico de Taguatinga desde 2014. Segundo ele, a percepção de acolhimento pela comunidade é perceptível, assim como o desenvolvimento dos atletas.
“Os pais se sentem aliviados por achar um lugar qualificado que acolhe os filhos e desenvolve a sociabilidade e a parte pedagógica, mostrando que é possível promover a inclusão e até seguir carreira de atleta”, resume.
Apoio fundamental
A inclusão conta com todo apoio do GDF. Segundo o professor, o movimento paralímpico é muito forte no Brasil, e o DF não fica atrás ao custear viagens dos atletas para competições – como as Paralimpíadas Escolares, que ocorrem em novembro, em São Paulo. “Este apoio proporciona oportunidades que famílias sem condições financeiras não teriam”, aponta. “É um ganho mesmo para quem não vai ser atleta, porque trabalha a inserção social e muda o olhar dos colegas da escola. O que era um olhar de capacitismo se torna um olhar de admiração ao verem os colegas viajando e competindo”.
Um dos alunos de parabadminton, Keyson Souza Souto, 15, confirma a mudança que o esporte trouxe para sua vida. Diagnosticado com hidrocefalia e uma lesão medular, ele passou em uma seletiva para participar dos Jogos Escolares. “Eu gosto bastante do badminton”, afirma. “É divertido, melhora os reflexos e a coordenação motora. Vou treinar muito e, quem sabe, um dia vou representar o país”.
A mãe do garoto, Ana Paula Santos de Souza, 33, conta que o filho despertou o interesse pela modalidade em 2018 e, desde então, não perde um treino, tendo melhorado o desempenho na escola e passando a gastar menos tempo no celular e na televisão. “Ele já vai treinar sozinho, tem essa independência que me deixa tranquila”, comenta.
Quem também encontrou prazer no esporte foi Liviane Cibele Oliveira de Souza, 22, diagnosticada com síndrome de Down. Ela pratica natação no COP de Taguatinga três vezes por semana – rotina que acalma, controla a ansiedade e traz outros benefícios. “Hoje fico com o coraçãozinho mais tranquilo porque os especialistas sempre me dizem que ela tem mais qualidade de vida com o esporte, e ela gosta muito de nadar, porque traz equilíbrio físico, emocional e trabalha os limites”, narra a mãe de Liviane, Zenaide Alves de Oliveira, 48. “A gente vê a qualidade no atendimento; os professores são excelentes e treinam os atletas paralímpicos. Estamos com os melhores”.
Esporte da inclusão
“A bocha na vida dos atletas paralímpicos, devido a essa grande limitação que eles têm, abriu um horizonte que jamais eles imaginariam ter”
Marcos Oliveira
professor da rede pública
Entre todas as modalidades paralímpicas, a bocha é considerada a mais inclusiva, pois reúne os atletas que não se enquadram em todas as outras. Quem atesta isso é o professor da rede pública de ensino Marcos Oliveira, que há 34 anos trabalha com pessoas com deficiência.
“A bocha na vida dos atletas paralímpicos, devido a essa grande limitação que eles têm, abriu um horizonte que jamais eles imaginariam ter”, explica. “Eles podem hoje mostrar para a família, para os colegas de escola, que são atletas, que competem, que têm igualdade de condições, que podem se superar e que fazem coisas que outras pessoas não fazem.”
Sob a tutela do professor aposentado Ulisses Araújo, Marcos transmite o conhecimento para alunos da rede pública e tem ajudado a valorizar o esporte. “Nós implantamos [a bocha] em todas as unidades escolares, em todos os centros olímpicos, e hoje somos uma referência de bocha no Brasil em nível escolar”, pontua. “Tivemos sete ou oito atletas na seleção brasileira que viajaram para mundiais, para pan-americanos. A bocha está crescendo muito em Brasília, e isso eu posso dizer [que é impulsionado] por meio do GDF com a Secretaria de Educação”.
A dona de casa Maria Aparecida Silva Lima, 33, encontrou na bocha uma forma de fortalecer vínculos com a filha, a atleta Mariany Silva Lima, 14, aluna da Escola Classe 502 de Samambaia. Foi durante o acompanhamento da filha na Rede Sarah que ela descobriu o esporte e o trabalho do GDF.
“Sou muito grata, porque, se não fosse o projeto na vida da minha filha, ela não tinha desenvolvido”, relata Maria Aparecida. “Ela achou que não poderia nunca fazer nada, uma criança, simplesmente uma cadeirante. Hoje não, hoje ela é vista como uma atleta de bocha. Esse projeto é lindo. Imagina ela só dentro de casa, ela ia evoluir em quê? Hoje ela sabe, hoje tem medalhas, podemos viajar. As amigas dela, a Evani [Calado], estão em Paris, competindo. Sou muito grata ao governo por isso.”
Brasil nos Jogos Paralímpicos
O Brasil é representado por uma delegação de 280 atletas nos Jogos Paralímpicos de Paris. O grupo é formado por 255 esportistas com deficiência, 19 atletas-guia (18 do atletismo e um do triatlo), três calheiros da bocha, dois goleiros do futebol de cegos e um timoneiro do remo. A equipe brasileira disputará 20 das 22 modalidades dos Jogos.
Dos oito paratletas brasilienses convocados, quatro residem no DF e contam com o apoio do programa Compete Brasília para alcançar os índices exigidos e garantir uma vaga nas Paralimpíadas.
Como se inscrever
Para encontrar o CIDP mais próximo, basta entrar em contato com as regionais de ensino, que disponibilizam os telefones no site do GDF. Os centros de iniciação paradesportiva estão localizados nas coordenações regionais de ensino (CREs) de Taguatinga, Ceilândia, Guará, São Sebastião, Santa Maria e Samambaia. Para participar, o estudante precisa apresentar na CRE a declaração de escolaridade emitida pela unidade escolar.
Na unidade de Taguatinga, há cerca de 30 alunos e vagas abertas para mais inscrições. São seis turmas, cada uma com oito vagas. As aulas ocorrem às segundas, quartas e sextas, no contraturno, e atendem alunos a partir de sete anos que possuem laudo médico que indique a deficiência. Nos COPs, por sua vez, a inscrição pode ser feita pela página da Secretaria de Esporte.