DF na Real: Pacientes do DF viram reféns do jogo de empurra entre hospitais e UBSs



População sofre com falta de orientação sobre assistência em hospitais regionais e unidades básicas. O que os candidatos ao GDF têm a dizer?

Por Douglas Carvalho

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Há dois anos, o GDF iniciou um projeto de remodelação no sistema de atendimento na saúde pública local. O objetivo, segundo o governo, era desafogar a demanda nos hospitais regionais. Para isso, foi determinado que a atenção primária seria feita nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Entretanto, na avaliação de pacientes e servidores, a estratégia agravou os problemas existentes e criou outros.

Por falhas na orientação, doentes padecem todos os dias nas diferentes regiões administrativas, sem saber a qual instituição recorrer em cada situação. Devido a esse impasse, a população se vê em um jogo de empurra entre os hospitais regionais e as UBSs.

Metrópoles percorreu quatro desses locais – antes denominados centros de saúde – em Taguatinga, Ceilândia, Gama e Sobradinho. Neles, encontrou pacientes confusos sobre as mudanças no atendimento. Houve quem tivesse peregrinado por quatro hospitais regionais para conseguir atendimento e quem chegasse ao nono mês de gestação sem acompanhamento pré-natal adequado.

E, neste domingo (5/8), inaugura uma série de reportagens nais quais abordará problemas de diversos setores, como saúde, educação, mobilidade e segurança pública. A cada editorial, todos os candidatos ao GDF serão questionados sobre o que eles fariam, caso eleitos, para solucionar as questões. Confira, ao final da matéria, o que os políticos têm a dizer.

“Fui a Taguatinga, Ceilândia, ao Guará e Gama até que meu filho fosse atendido, no Hospital da Criança de Brasília. Só consegui porque ele estava com 40 graus de febre”, conta a manicure Raquel Pereira de Oliveira, 30 anos, moradora de Ceilândia.

No mês passado, o filho caçula de Raquel, 3, teve uma das recorrentes crises de bronquiolite (doença respiratória causada por infecção viral). Como reação imediata, a mulher o levou a um hospital regional. Mas, segundo contou, recebeu a informação de que não havia vaga nas emergências desse tipo de unidade.

Também em julho, o menino contraiu sarampo. Ele está curado e, agora, recebe acompanhamento na UBS 10 de Ceilândia. Apesar disso, Raquel ainda demonstra confusão sobre o atendimento. “Ficamos num ‘vai e volta’. É complicado, porque não tenho condições de pegar ônibus com meu filho mal”, reclama. A mãe da criança se queixa ainda de mau-trato dos profissionais, o que, conforme ela, culmina na falta de orientação adequada dos pacientes.

Sem acompanhamento na reta final
Grávida de nove meses, a pedagoga Poliana Araújo, 25, relatou dificuldade em continuar o acompanhamento pré-natal na rede pública. A penúria dura um mês. Antes disso, de acordo com a gestante, o atendimento transcorria normalmente. “No quinto mês de gravidez, descobri diabetes. Fui à UBS 7 de Taguatinga, onde o médico fez encaminhamento para eu ir à emergência do hospital regional da cidade [HRT]”, conta.

Poliana, então, recorreu ao HRT. Mas, conforme afirma, não tem recebido atendimento nem na unidade nem na UBS. Retornou ao centro de saúde, localizado a três quadras de onde mora, na última quinta-feira (2), em situação de desespero, pois o parto está próximo: a previsão para ela dar à luz é 20 de agosto. A mulher se queixou de dores no corpo, principalmente nas costas, e edema nos pés causados pela diabetes gestacional.

“Vim pela última vez em 23 de julho, remarcaram a consulta para hoje [quinta]. Falaram que não tinha médico na equipe. Isso me atrapalha no meu serviço e no do meu marido também. É ele quem me traz”, lamenta. “Dependo de posições dos médicos. Tanto do HRT quanto da UBS”, afirma Poliana.

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

1/6 UBS 10 de Ceilândia é uma das 171 unidades básicas do DF

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

2/6Pacientes aguardam atendimento na UBS 7 de Taguatinga

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

3/6Poliana Araújo tem diabetes gestacional. Ela está no nono mês de gravidez

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

4/6Por causa da doença, a gestante tem dores no corpo e edema nos pés

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

5/6Pacientes aguardam atendimento na UBS 5 do Gama

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

6/6UBS 10 de Ceilândia

Adequação
A proposta do modelo executado pela Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) poderia alavancar a área, mas vários entraves retardam o processo. A afirmação é da professora de saúde coletiva da Universidade de Brasília (UnB) Carla Pintas Marques.

A docente acredita que a transferência, às UBSs, de parte da demanda atribuída durante décadas aos hospitais regionais tem potencial para desafogar o sistema. O problema, diz, se dá a um conjunto de fatores, entre eles, a falta de recursos financeiros, insumos e profissionais.

E mais: falhas na orientação também têm confundido os pacientes. “Com a mudança, houve desconforto grande dos profissionais. Às vezes, má vontade deles, não entendem, são contrários”, pontua.

“Às vezes, a gente culpabiliza o gestor máximo do setor, mas não é ele quem vai resolver. É um conjunto. Prova disso é que há lugar onde se atende bem e outros em que se atende mal”, ressalta. Por fim, Carla salienta a necessidade de a população se acostumar a esse novo processo, de diferenciar as situações nas quais deve recorrer a hospitais ou UBSs.

Outra questão, diz a especialista, refere-se à descontinuidade de políticas públicas de saúde. De acordo com a docente, nos últimos 20 anos, todos os governadores do DF modificaram bastante as diretrizes da saúde local. Dessa forma, a cada gestão, muda-se toda uma estrutura, sem conseguir implementar soluções definitivas.

Desinformação
Enquanto isso, a população fica refém da falta de orientação adequada. A situação da dona de casa Fabiana Plasto, 37, ilustra o vaivém dos pacientes. Há três semanas, ela começou a sentir mal-estar, fraqueza e dor no corpo.

Moradora do Gama, foi ao hospital regional da cidade (HRG). Porém, não recebeu atendimento. Na quinta (2), deslocou-se até a UBS 5, onde pegou pedidos de exames, duas semanas após o início dos sintomas, que, segundo a dona de casa, não passaram desde então.

Fabiana passará por parte dos procedimentos na próxima segunda (6), no HRG. Os resultados devem ficar prontos depois de 15 dias. Enquanto isso, a mulher teme pelo agravamento do quadro de saúde. “Não sei o que tenho, nem o médico. Estou preocupada”, lamenta.

Hugo Barreto/Metrópoles
Fabiana Plasto sente mal-estar há três semanas e busca atendimento em UBS do Gama – Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

O que dizem os buritizáveis

Metrópoles questionou os candidatos a governador do DF sobre o que podem fazer para resolver esses impasses na saúde pública. Confira:

Foto: Filipe Cardoso/Especial para o Metrópoles

1/8Alexandre Guerra (Partido Novo): “A saúde é ponto sensível, sofre com a falta de gestão há anos e o cidadão sofre para ser atendido nos hospitais regionais e nas UBSs. É preciso adotar o modelo logístico do setor privado, evitando a falta de medicamentos, com melhor planejamento das aquisições e eliminando a corrupção das compras emergenciais. Precisamos de novos padrões de gestão, a exemplo do êxito do Sarah [Kubitschek].”

Foto: Divulgação

2/8Antônio Guillen (PSTU): “Devido ao sucateamento da saúde primária e preventiva, o povo procura os hospitais, que ficam sobrecarregados. Defendemos nomear mais servidores, auditoria popular de todos os contratos da Secretaria de Saúde, parar de pagar a dívida pública e usar os recursos para abertura de novos leitos, unidades de saúde, no atendimento primário e saúde preventiva.”

Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

3/8Eliana Pedrosa (Pros): “Vamos investir na valorização dos profissionais de saúde, pois hoje temos equipes desanimadas e estrutura sucateada. Feito isso, vamos aprimorar a atenção básica com a construção de mais UBSs e UPAs, além da ampliação da cobertura das equipes de Saúde da Família. Vamos buscar ajuda na rede privada para acelerar exames e diagnóstico por imagem e evitar a longa espera”.

Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

4/8Fátima Sousa (PSol): “Vamos reorganizar o SUS. As pessoas serão cuidadas em casa, por médicos e outros profissionais, preventivamente. As equipes vão direcionar os pacientes às unidades, conforme a gravidade. UBSs e UPAs mais estruturadas, para que hospitais sejam acionados apenas nos casos complexos, destravando o sistema”.

Foto: Filipe Cardoso/Especial para o Metrópoles

5/8Paulo Chagas (PRP): “O Sistema Único de Saúde (SUS) está desestruturado no DF. As UBSs deveriam atender 80% das necessidades da população. Como estão mal posicionadas, desequipadas e sem pessoal, a população procura diretamente os hospitais. A sobrecarga gera longas esperas e o mau atendimento”

Foto: Reprodução

6/8Paulo Thiago Barreto (PRTB): “Contratar novos profissionais, reestruturar e reabrir os serviços de emergência dos hospitais regionais, garantindo o atendimento imediato dos pacientes de risco elevado conforme a classificação de risco de Manchester (vermelha e laranja). Construir novas UPAs e UBSs e melhorar as já existentes. Priorizar a gestão eficiente para acabar com o jogo de empurra. A sociedade terá o atendimento digno que merece”.

Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

7/8Rodrigo Rollemberg (PSB): “A Saúde continuará sendo prioridade do nosso próximo governo. Reconhecemos que precisamos melhorar, mas os avanços são inegáveis. A Estratégia Saúde da Família chegou a quase 70% de cobertura. Vamos ampliá-la para 100% da população. O modelo do Instituto Hospital de Base (IHB), 100% público e gratuito, significou mais celeridade e eficiência na compra de equipamentos e medicamentos. Vamos ampliar os espaços de atendimentos, como Hospital do Guará, além das UBSs”.

Fogo: Michael Melo/Metrópoles
8/8Rogério Rosso (PSD): “Com motivação e valorização dos servidores, teremos de volta a melhor saúde do Brasil. Vamos fazer a tecnologia e a inovação ficarem a serviço do cidadão. Marcação de consultas por celular, prontuários eletrônicos integrados, busca do médico mais próximo por meio de aplicativos. Vamos despachar todas as semanas em um hospital diferente, um centro de saúde, uma UPA, para solucionar esse caos”.

Até a publicação desta reportagem, os buritizáveis Alberto Fraga (DEM), Júlio Miragaya (PT) e Ibaneis Rocha (MDB) não haviam respondido o contato da reportagem.

O que diz a SES-DF
Diretor da Estratégia Saúde da Família (ESF) da Secretaria de Saúde do DF, Wallace Santos recomenda a ida às UBSs em casos considerados mais leves. “Inclusive, nos agudos, como dor de cabeça forte e infecção intestinal. Deve-se procurar emergências de hospitais em situações mais graves”, exemplifica.

Apesar disso, o diretor diz que pacientes não terão atendimento recusado se chegarem às UBSs com quadros delicados e urgentes.

Santos destaca também que essas unidades não dispõem mais de médicos especialistas focais, como ginecologistas, pediatras e infectologistas, por exemplo. “Esses profissionais estão em atenção secundária, em ambulatórios”, explica.

Hoje, o DF conta com 171 UBSs, incluindo as prisionais, segundo o diretor. Wallace Santos afirma que em todas elas há atenção primária. Cada equipe das UBSs é composta por um médico de família e comunidade, um enfermeiro, um ou dois técnicos de enfermagem e até seis agentes comunitários.

O diretor reforça que “toda mudança requer tempo e é algo paulatino”, pois, de acordo com Santos, os usuários precisam se acostumar ao novo modelo. Por fim, o integrante da secretaria ressalta que os pacientes devem procurar as UBSs não somente quando estiverem doentes, mas para fazerem a prevenção.

Fonte: Metrópoles



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