Universidade reforça falta de evidência científica de eficiência dos medicamentos para tratamento da Covid-19
Por Kleber Karpov
Na quinta-feira (9/Abr) a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), publicou Nota em que aborda o uso de cloroquina e hidroxicloroquina. Os medicamentos, utilizados para tratar pessoas diagnosticadas com malária e lúpus, passou a ser especulado, em especial no meio politico, para o tratamento da Covid-19, doença causada pelo coronavírus, o que divide opiniões.
A UNICAMP, aponta ter ouvido“especialistas na área, de dentro e de fora da instituição, e amplamente amparada por estudos científicos”. Segundo nota da universidade, tais pareceres e estudos apontam que “que não há, até o momento, evidência científica suficiente baseada em ensaios clínicos com humanos sobre a eficácia desses medicamentos para o tratamento da doença causada pelo novo coronavírus.”
Solução política
No país, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, tem utilizado cadeia nacional a rede de emissoras de rádio e TV, para defender o uso dos medicamentos, nos primeiros cinco dias de sintomas, de pessoas diagnosticadas com a Covid-19. Caso que gerou, recentemente, uma crise entre Bolsonaro e o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. A ponto de o chefe do Executivo, chamar uma reunião com a cúpula de subordinados para, supostamente, tratar da demissão de Mandetta, o que foi revertido, por intervenção de militares que compõem o governo.
Mandetta, que é médico por formação, discorda quanto ao uso de tais medicamentos, nas condições apontadas por Bolsonaro. Isso for falta de sustentação científica da eficiência do tratamento com cloroquina e hidroxicloroquina, dado os riscos aos pacientes, por causa dos efeitos colaterais graves cardíacos, renais e pancreológicos.
Também na manhã de quinta-feira, a CNN Brasil, noticiou o flagrante de um jornalista, do ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, com o ex-ministro, o deputado federal, Osmar Terra, em que sugeriu a exoneração de Mandetta.
Em São Paulo, o governador Bruno Covas (PSDB), autorizou e incluiu uso da Cloroquina, no protocolo oficial da Secretaria Municipal de Saúde de SP. Porém, desde que prescrita por um médico e, com o consentimento do paciente.
Confira a Nota
Nota da Unicamp
A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) reitera o seu compromisso com a ética e com a ciência na busca por soluções que atendam o adequado acolhimento do paciente, o diagnóstico preciso e a melhor terapêutica, visando minimizar os efeitos da pandemia COVID-19. Há em todo o mundo, inclusive no Brasil, uma busca incansável por medicamentos eficazes para o tratamento dos doentes. Essa busca deve ser pautada exclusivamente pela pesquisa conduzida seguindo métodos científicos bem estabelecidos, com protocolos claros e subordinados a valores éticos. Assim, no que diz respeito a declarações sobre o uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina (HCQ) para o tratamento da COVID-19, isoladamente ou em associação com azitromicina (HCQ + AZT), a Unicamp, ouvindo especialistas na área, de dentro e de fora da instituição, e amplamente amparada por estudos científicos sobre o tema, corrobora as recomendações dos órgãos sanitários e da comunidade médico-científica mundial de que não há, até o momento, evidência científica suficiente baseada em ensaios clínicos com humanos sobre a eficácia desses medicamentos para o tratamento da doença causada pelo novo coronavírus.
Como reiterado em editorial de 08 de abril de 2020 da British Medical Journal, uma das publicações científicas da área médica mais respeitadas do mundo, o uso da cloroquina e seus derivados na COVID-19 é prematuro e potencialmente prejudicial devido a efeitos colaterais amplamente conhecidos pela comunidade médica.
Medicamentos como a HCQ têm efetivamente sido usados para pacientes portadores de malária ou doenças autoimunes. No momento, a administração de cloroquina e seus derivados para a COVID-19 deveria ocorrer apenas em ensaios clínicos controlados para pacientes internados sob supervisão médica restrita e intensiva. Não há, portanto, indicação formal dos mais respeitados órgãos de saúde pública do Brasil e do exterior para o uso profilático ou doméstico desses fármacos sem a estrita supervisão, responsabilidade médica e concordância explícita dos pacientes.
As manifestações de apoio ao uso da HCQ para COVID-19 se baseiam em evidências frágeis, não apoiadas por investigações sólidas que devem ser fundamentadas em ensaios clínicos controlados. A universidade, como centro do conhecimento, deve sempre recomendar indicações e propostas que valorizem a razão científica em lugar de soluções intuitivas e crenças, que apesar de geralmente bem intencionadas podem estar eventualmente equivocadas.
Reitoria
Campinas, 09 de abril de 2020.
Recuos
Também defendida em outros países, um dia antes do último pronunciamento de Bolsonaro (7/Abr), que defendeu o uso da cloroquina para tratar de pacientes positivados para a Covid-19, o Centro de Prevenção e Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC, na sigla em inglês), removeu do site, orientações aos médicos para prescrição de medicamentos utilizados contra a malária para tratar a Covid-19.
O CDC em vez disso passou a alertar que “não há drogas ou outros tratamentos aprovados pela Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA, na sigla em inglês) para prevenir ou tratar a Covid-19.”.
Na Suécia, médicos do Hospital Universitário Sahlgrenska e do Hospital Sul, pararam de administrar a cloroquina, tanto por falta de resultado efetivo quanto por “grave efeito collateral”, causado pelo medicamento. Esse é o caso do Hospital Universitário Sahlgrenska. Por lá, o professor e médico chefe da clínica de infecção da unidade Magnus Gisslén do Sahlgrenska apontou os riscos do uso do medicamento.
“Houve relatos de suspeita de efeitos colaterais mais graves do que pensávamos. Não podemos descartar efeitos colaterais graves, especialmente no coração, e é um medicamento de dosagem difícil. Além disso, não temos fortes evidências de que a cloroquina tenha efeito sobre a covid-19.”, afirmou Gisslén, ao jornal Göteborgs-Posten (Veja Aqui)