João Badari
Neste mês de novembro faz um ano que foi aprovada a reforma da Previdência, por meio da Emenda Constitucional 103. Com a promulgação do Governo Federal, muitas regras previdenciárias mudaram e os trabalhadores, segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), além de desconhecerem muitas delas, estão sofrendo com a dificuldade de acesso aos benefícios, como a aposentadoria.
A chamada Nova Previdência passou a vigorar desde o dia 13 de novembro do ano de 2019 e, sem dúvidas, os pontos mais prejudiciais da reforma foi a extinção da aposentadoria por tempo de contribuição, pela criação de uma idade mínima e também as novas formas de calcular o benefício.
Neste ano de 2020 algumas regras transitórias já sofreram modificações, e novamente irão mudar em 2021, implicando na concessão dos benefícios.
Um dos pontos de principal discussão foi o final da aposentadoria por tempo de contribuição, com a criação da idade mínima para se aposentar. No Regime Geral da Previdência Social (RGPS) a regra geral de aposentadoria passou a exigir, das mulheres, pelo menos 62 anos de idade e 15 anos de contribuição. No caso dos homens, 65 anos de idade e 20 anos de contribuição. O tempo de contribuição mínimo permaneceu em 15 anos somente para os homens que estiverem filiados ao RGPS antes de 13/11/2019.
No RPPS da União, a nova regra geral exige 62 anos de idade para mulheres e 65 para os homens, com pelo menos 25 anos de contribuição, 10 anos de serviço público e 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria.
Para os professores, por exemplo, são 25 anos de contribuição e idade mínima de 57 anos, para as mulheres, e de 60 anos para os homens. Essa regra somente se aplicará aos professores que comprovarem, exclusivamente, tempo de efetivo exercício nas funções de magistério na educação infantil, no ensino fundamental ou no ensino médio.
Policiais, tanto homens quanto mulheres, podem se aposentar aos 55 anos de idade, desde que tenham 30 anos contribuição e 25 anos de efetivo exercício da função. Essa regra se aplica aos cargos de agente penitenciário, agente socioeducativo, policial legislativo, policial federal, policial rodoviário federal, policial ferroviário federal e policial civil do Distrito Federal.
Já em relação ao cálculo do benefício, pelas regras trazidas com a Nova Previdência não são mais desconsiderados os 20% menores salários de contribuição e também não há a incidência do fator previdenciário. Os benefícios têm o cálculo inicial de 60% da média dos salários de contribuição posteriores a julho de 1994 e têm um acréscimo de 2% ao ano trabalhado a partir do 15o anos para mulheres e do 20o ano para homens. Ex: mulher com 18 anos de contribuição terá um coeficiente de 66%, homem com 25 anos de contribuição terá um redutor de 30%. O percentual do benefício recebido poderá ultrapassar 100% para mulheres que contribuírem por mais de 35 anos e para homens que contribuírem por mais de 40 anos – sempre limitado ao teto do RGPS.
Para os servidores públicos federais que ingressaram na carreira a partir de 1º de janeiro de 2004, o cálculo do benefício será semelhante ao do Regime Geral. Já para os que ingressaram no serviço público até 31 de dezembro de 2003, ficará mantida a integralidade, ou seja, o valor da aposentadoria será o do último salário, desde que atendidos os requisitos das regras de transição.
As regras de transição são o foco das principais dúvidas dos trabalhadores que pretendem dar início ao processo de aposentadoria. Importante ressaltar que o trabalhador que já tinha cumprido os requisitos de aposentar-se até 13 de novembro de 2019 pode utilizar as regras antigas, pois o direito adquirido foi preservado.
Vale então explicar cada regra e ponto de transição:
– Transição por sistema de pontos – Essa regra soma o tempo de contribuição com a idade. Mulheres podem se aposentar a partir de 87 pontos e homens, de 97, em 2020. O tempo mínimo obrigatório de contribuição é de 30 anos, para mulheres, e de 35 anos, para homens. A cada ano será exigido um ponto a mais, chegando a 105 pontos para os homens, em 2028, e 100 pontos para as mulheres, em 2033.
Para professores ocorre um decréscimo de 5 anos, ou seja, as professoras podem pedir aposentadoria a partir da soma de 82 pontos, desde que tenham o mínimo de 25 anos de contribuição, e os professores, com 92 pontos e, no mínimo, 30 anos de contribuição. Os pontos subirão até 92, para elas, e até 100, para eles.
– Transição por tempo de contribuição e idade mínima – As mulheres podem se aposentar aos 56 anos e 6 meses, com pelo menos 30 anos de contribuição. Já para os homens, a idade mínima será de 61 anos e 6 meses com pelo menos 35 anos de contribuição. A idade mínima exigida subiu seis meses a cada ano, até chegar aos 62 anos de idade para elas, em 2031, e aos 65 anos de idade para eles, em 2027. Professores têm redução de 5 anos na idade e tempo de contribuição.
– Pedágio de 50% – As mulheres com mais de 28 anos de contribuição e os homens com mais de 33 anos de contribuição podem escolher pela aposentadoria sem idade mínima, desde que cumpram um pedágio de 50% sobre o tempo mínimo que faltava para se aposentar (30 anos para as mulheres e 35 anos para os homens). Por exemplo, homem com 34 anos de contribuição deverá trabalhar por mais 1 ano e 6 meses. Neste caso não se aplica os 60% para a realização do cálculo, e sim o fator previdenciário (exceção).
– Pedágio de 100% – Essa regra estabelece uma idade mínima e um pedágio de 100% do tempo que faltava para atingir o mínimo exigido de contribuição. Para mulheres, a idade mínima é de 57 anos e, para homens, de 60 anos. Por exemplo, uma mulher de 57 anos de idade e 27 anos de contribuição terá de trabalhar mais seis anos. Para trabalhadores vinculados ao RGPS, o valor da aposentadoria é de 100% da média de todos os salários de contribuição desde julho de 1994 (não haverá o redutor de 60% mais 2% a cada anos contribuído à partir de 15 ou 20 anos). Professores têm a redução de 5 anos.
– Servidores da União – Transição por sistema de pontos e idade mínima – podem se aposentar pelo sistema de pontos, também cumprindo 87 pontos para mulheres e 97 pontos para homens, desde que cumpram também o requisito de idade mínima, que começou em 2019 em 56 anos para as mulheres e em 61 anos para os homens, passando para 57 e 62 anos, respectivamente, em 2022. A cada ano será exigido mais um ponto, chegando a 105 para os homens, em 2028, e a 100 para as mulheres, em 2033.
O tempo de contribuição mínimo será de 30 anos, para servidoras, e de 35 anos para servidores. Todos devem ter, pelo menos, 20 anos de serviço público e 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria. Podem se aposentar com o valor integral do último salário na ativa as mulheres que tiverem completado 62 anos e os homens a partir dos 65 anos, desde que tenham ingressado na carreira até 31 de dezembro de 2003.
Os servidores que tiverem ingressado a partir de 2004, o cálculo seguirá a regra geral da Nova Previdência: 60% da média de todas as contribuições mais dois pontos percentuais a cada ano de contribuição que exceder 20 anos (tanto homens quanto mulheres). Professores têm redução de 5 anos, como no RGPS.
Já a transição com idade mínima e pedágio de 100% permite que o servidor se aposente desde que cumpra em dobro o tempo que falta para se aposentar e tenha atingido a idade mínima. Para servidoras, a idade mínima será de 57 anos e para os servidores, de 60 anos. Também é necessário comprovar 20 anos no serviço público e 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria. O benefício será equivalente à última remuneração, para quem tiver ingressado na carreira até 31 de dezembro de 2003, ou a 100% da média de todos os salários desde julho de 1994, para os que ingressaram a partir de 2004. Professores têm redução de cinco anos na idade e no tempo de contribuição, como no RGPS.
Outro ponto polêmico foi a mudança na pensão por morte. De acordo com as novas regras, o pagamento é de de 50% do valor da aposentadoria acrescido de 10% para cada dependente. Para os dependentes inválidos ou com deficiência grave, o pagamento é de 100% do valor da aposentadoria no Regime Geral, sem exceder o teto. No caso de servidores públicos da União, do valor que exceder o teto é pago 50% mais 10% por dependente. Cônjuges ou companheiros de policiais e de agentes penitenciários que morrerem por agressão sofrida em decorrência do trabalho têm direito à pensão integral.
O cálculo da pensão foi extremamente penoso na maioria dos casos, pois além de não ser mais integral, é aplicada a proporcionalidade pelo número de dependentes. Cito como exemplo um trabalhador que tinha 10 anos de contribuição, e como dependentes a esposa e um filho. Caso venha a falecer, o benefício será de 60%, e posteriormente ainda vai ser multiplicado por 70%. Uma dupla redução, trazendo uma pensão com valor inferior a metade do anterior.
Outro ponto de destaque foi o limite e acúmulo de benefício. Nos casos em que a lei permitir acúmulo de benefício, são pagos 100% do benefício de maior valor a que a pessoa tem direito, mais um percentual da soma dos demais.
Esse percentual vai variar da seguinte forma: 100% do valor até um salário mínimo; 60% do valor que estiver entre um e dois salários mínimos; 40% do que estiver entre dois e três salários; 20% entre três e quatro salários mínimos; 10% do que ultrapassar quatro salários mínimos.
A aposentadoria especial também foi afetada e prejudicou trabalhadores em contato com agentes cancerígenos, como, por exemplo, combustíveis, agrotóxicos, minérios e a radiação presente em laboratórios de raio X, entre outros. Conforme as novas regras aprovadas pela reforma da Previdência, os critérios para alcançar o direito à aposentadoria especial variam conforme o grau de periculosidade do trabalho. Homens e mulheres necessitam completar 60 anos de idade mais 25 anos de tempo especial em atividade de menor risco; 58 de idade mais 20 anos de tempo especial para o médio risco; e 55 anos de idade mais 15 anos de tempo especial para atividades de maior risco.
A reforma completa seu primeiro ano de aniversário, porém os trabalhadores não possuem motivo para comemorarem sua aprovação. Benefícios foram reduzidos e os obstáculos para dar entrada na aposentadoria ficaram maiores. O sonho do trabalhador que pretende alcançar a aposentadoria ficou mais distante. Mais tempo de trabalho e contribuição aos sofres da Previdência, com direitos reduzidos. Era uma reforma necessária, sem dúvidas, mas não atingiu a justiça social de um país continental como o Brasil.
João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário
e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados