A alta taxa de mortalidade de pacientes após procedimento de intubação nas UTIs brasileiras chamou a atenção de parlamentares, que levaram o problema à Comissão Temporária da Covid-19. Em audiência realizada nesta sexta-feira (28), o senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) apresentou um estudo de 2020, mostrando o país num ranking ruim em relação ao número de mortos: 80% dos pacientes. O nível é bem superior ao registrado na Ásia (47%), América do Norte (46%) e Europa (36%).
— Quando analisamos as diferenças regionais dentro do país, também vemos discrepâncias. Na Região Norte, por exemplo, o índice chega a 86,7%; no Nordeste, 83,7%, e vai diminuindo no Sudeste e Sul. A pergunta é: com a quantidade de mortes que a gente vê hoje no país, parece que ainda não estamos preparados, não é? Não estávamos, antes da pandemia, e tudo indica que ainda não continuamos a nos preparar — avaliou.
O problema também foi levantado pelo presidente da comissão, Confucio Moura (MDB-RO), e pelo senador Esperidião Amin (PP-SC), que lembrou a situação caótica vivida em Manaus, com o elevado número de óbitos e até falta de oxigênio para pacientes.
O presidente da Comissão de Terapia Intensiva da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Bruno Vale Pinheiro, explicou que o estudo apontado por Styvenson teve caráter observacional, sem capacidade de apontar com precisão a causa do alto índice de letalidade. No entanto, é possível levantar hipóteses, entre as quais, o alto número de pacientes; a ausência de condições físicas ideais para atendimento; o improviso; a escassez de profissionais e a falta de treinamento de pessoal.
— A causa dessa mortalidade elevada é multifatorial. Em primeiro lugar, um número muito grande de pacientes muito graves chegando ao mesmo tempo. Uma avalanche de pacientes graves numa estrutura que até então não estava dimensionada para isso em relação a insumos, equipamentos e equipe treinada. Isso certamente diminui a capacidade de cuidar dos doentes e vai impactar no resultado — disse.
A presidente da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Suzana Lobo, lembrou ainda que a mortalidade tem a ver com a desigualdade social, que se reflete nas condições de atendimento à população.
— A taxa de mortalidade nas UTIs privadas é menor do que das UTIs públicas. As unidades que são mais organizadas têm resultados melhores. Então, é uma questão de organização também do sistema como um todo. Os intensivistas têm que ter a coragem de falar para o mundo que a resposta de uma pandemia não está na UTI; está na comunidade. A pandemia se controla fora da UTI, diminuindo a transmissão com vacinas e todas as coisas que nós já sabemos. Precisamos estudar onde foi que nós erramos, tudo que aconteceu aqui, para que isso não aconteça nunca mais — afirmou.
Oxigenação extracorpórea
Os especialistas deixaram claro também que não é a falta da aplicação da oxigenação por membrana extracorpórea que está causando o elevado número de mortes. Conhecida como ECMO, a técnica usa mecanismo que retira o sangue do paciente, faz com que ele circule fora do corpo e depois o devolve à corrente sanguínea. O procedimento foi usado no tratamento do ator Paulo Gustavo, que morreu vítima da covid-19 no início do mês.
— É um suporte ventilatório complexo, que exige não só o equipamento, mas equipe treinada para operar. A imensa maioria dos pacientes, com ventilação mecânica em UTIs nem vai precisar. É a ponta da ponta do tratamento e não é coisa do dia a dia na maioria das unidades de terapia intensiva — explicou Bruno Pinheiro.
Por conta dessas peculiaridades, o representante da Sociedade Brasileria de Pneumologia disse que, por ser um tratamento de grande complexidade e de custo elevado, o ideal é a criação de centros de tratamento que sirvam de referência para o atendimento de um público maior.
Paulo Guedes
Também participaram da reunião desta sexta-feira, a representante do Ministério da Saúde, Priscila Louly, e a coordenadora do Plano Nacional de Imunização, Francieli Fantinato. A Comissão Temporária da Covid-19 volta a se reunir nesta segunda-feira (31) para receber Bruno Funchal, secretário Especial de Fazenda do Ministério da Economia, para um debate sobre o Plano Nacional de Imunização (PNI) e o cumprimento dos prazos de vacinação.