Por Luisa Doyle e Pedro Alves
O Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) começou a cumprir, na manhã desta sexta-feira (4), 22 mandados de busca e apreensão em uma operação que apura fraudes em contratos emergenciais de lavanderia da Secretaria de Saúde do DF (SES-DF). A ação foi nomeada “Dinheiro Sujo” e é realizada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
Entre os alvos da ação estão o ex-secretários de Saúde Rafael Barbosa e Elias Miziara, que ocuparam o cargo durante a gestão Agnelo Queiroz (PT). Ele não é alvo da ação desta sexta. A lista de investigados também inclui outros gestores da pasta à época (veja abaixo).
Ao G1, o advogado Joelson Dias, que representa Elias Miziara, disse que a defesa ainda não teve acesso aos documentos da ação e que em um outro processo, de improbidade administrativa, relacionado a fatos similares, a Justiça já absolveu o ex-secretário das acusações, em primeira instância.
A defesa de Rafael Barbosa também afirmou que não teve acesso aos autos do processo e que vai esclarecer os fatos, “em momento oportuno”. Os advogados também questionaram a ação desta sexta (veja íntegra ao fim da reportagem).
Os mandados estão sendo cumpridos no DF e outros quatro estados: São Paulo, Maranhão, Paraná e Santa Catarina. A Justiça ainda determinou o bloqueio de R$ 54 milhões de envolvidos.
De acordo com as investigações, as irregularidades ocorreram entre 2013 e 2016, em ao menos quatro unidades de saúde. Entre os problemas estão superfaturamento de contratos, pesquisas de preço fictícias durante a contratação, e prestação de serviços insatisfatórios.
Questionada sobre a ação, a Secretaria de Saúde disse que “sempre colabora com os órgãos de controle no fornecimento de informações e esclarecimentos solicitados, obedecendo aos prazos estabelecidos, com transparência e correção”.
Investigações
De acordo com o MP, apesar de existirem licitações para contratação de serviços de lavanderia, “os membros do grupo criminoso se uniram para simular situação de calamidade com o intuito de justificar a dispensa do procedimento licitatório e direcionar a contratação de empresas integrantes do grupo”.
Os investigadores afirmam que os envolvidos mantinham os processos de licitação parados propositalmente, até que os hospitais ficassem em “posição insustentável” quanto à lavagem de roupas. Então, direcionavam a contratação para a empresa NJ Lavanderia e outras duas, que fazem parte do mesmo grupo econômico, de forma emergencial, de acordo com o MP.
O órgão afirma que a companhia contratada ainda apresentava serviço de má qualidade. Uma fiscalização realizada à época encontrou diversos problemas.
“O transporte da roupa, até onde podemos averiguar, com quebra da cadeia asséptica, ou seja, roupas sujas e limpas sendo transportadas no mesmo caminhão (…) lavagem insatisfatória apresentando manchas, cheiro de sangue e rasgadas; Frequentemente as roupas não são secas adequadamente o que, por sua vez, vêm causando mofo nas peças”, diz o relatório.
As irregularidades teriam ocorrido nas seguintes unidades de saúde: Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), Hospital Regional do Gama (HRG), Hospital Regional de Sobradinho (HRS) e Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF).
Quem são os alvos?
- Rafael Barbosa: ex-secretário da Saúde do DF. Segundo o MP, autorizou o primeiro contrato emergencial com a empresa;
- José de Moraes Falcão: ex-subsecretário da Subsecretaria de Administração Geral (SUAG) da SES-DF. Segundo o MP, autorizou a despesa para 1ª dispensa de licitação no HRSM, além de desarquivar este procedimento licitatório de maneira fraudulenta.
- Elias Fernando Miziara: ex-secretário adjunto de Saúde e ex-secretário de Saúde do DF. Segundo o MP, autorizou a despesa, ratificou e assinou três dispensas de licitação.
- Daniel Veras: ex-chefe da Gerência de Hotelaria da SES-DF, órgão onde se concentravam os atos relacionados às contratações. Segundo o MP, foi responsável por direcionar as contratações.
- Silene Marques Furtado: chefe do Núcleo de Lavanderia, subordinada à Gerência de Hotelaria.
- Francisco Chagas da Silva: ex-diretor administrativo da Coordenação Geral de Saúde de Santa Maria (HRSM). Segundo o MP, atuou em conluio, ao menos, com Daniel Veras, para possibilitar a primeira contratação emergencial da empresa;
- Suellen Silva de Amorim: ex-diretora da Diretoria de Análise, Prospecção e Aquisições (DAPA) da Subsecretaria de Administração Geral (SUAG) da SES-DF. Segundo o MP, atuou ilicitamente na primeira dispensa de licitação no HRSM;
- Túlio Roriz Fernandes: ex-subsecretário de Administração Geral da SES-DF. Segundo o MP, autorizou indevidamente despesas e dispensas de licitação, sem ter competência para isso.
- Hérica Ferreira dos Santos: gerente da Gerência de Análise, Prospecção e Aquisições da SUAG da SES-DF. Segundo o MP, ajudou a direcionar uma das contratações.
- Guilherme Francisco Guimarães: ex-diretor da DAPA da SUAG da SES-DF. Segundo o MP, praticou pesquisa de preço maquiada para beneficiar a empresa.
- Nabil Dahdah: gestor da empresa citada na operação.
- Ricardo Castellar: gestor da empresa citada na operação.
- João Paulo Teo: gestor da empresa citada na operação.
Outra ação
Em 2015, o Ministério Público já havia entrado com ação por improbidade administrativa contra Rafael Barbosa, Elias Miziara e o ex-chefe da gerência de Hotelaria da SES-DF, Daniel Veras. O órgão também argumentava ocorrência de irregularidades na contratação da empresa NJ Lavanderia.
O processo foi julgado em primeira instância, em 2019. À ocasião, o juiz André Silva Ribeiro rejeitou todas as acusações, entendendo que elas não foram comprovadas.
O que dizem as defesas
Confira a íntegra da nota do advogado Joelson Dias, que representa Elias Miziara:
“Mais uma vez, Miziara lamenta muito que as informações cheguem sempre primeiro à imprensa, antes mesmo que a sua defesa tenha acesso aos autos do processo judicial e, assim, até para prestar os esclarecimentos que lhe são solicitados, possa conhecer em maiores detalhes o que de fato é imputado. Isso viola garantias constitucionais e antecipa de maneira inapropriada versão unilateral dos fatos, apenas da acusação.
Exemplo maior disso é que, segundo circula na própria imprensa, a ação penal teria por objeto a contratação de serviços de lavanderia.
Ocorre, se for mesmo esse o caso, que o Ministério Público estaria apenas a repetir ações sobre um mesmo assunto. Afinal, nos autos do Processo nº 0010583-96.2015.8.07.0018, o próprio Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), por um de seus juízes, já proferiu sentença julgando improcedentes os pedidos formulados pelo Ministério Público, refutando, assim, as suas alegações.
Ou seja, naquela ação judicial, Miziara já prestou os seus esclarecimentos e a própria decisão judicial mostrou que não tem absolutamente nenhuma responsabilidade pelo que o Ministério Público pretende lhe imputar, muito menos qualquer tipo de relacionamento ilícito com quem quer que seja. São muitos anos de serviços prestados como médico à comunidade do Distrito Federal, com muita dedicação e transparência na sua atuação funcional, razão pela qual espera e confia, com muita tranquilidade, que, no momento oportuno, quando inclusive tiver acesso aos autos, prestará, mais uma vez, os esclarecimentos necessários e a Justiça, também novamente, decidirá com isenção e imparcialidade, confirmando que, em relação a Miziara, simplesmente não procede nenhuma das alegações do Ministério Público.”
Confira íntegra da nota da defesa de Rafael Barbosa:
“Munhoz & Mendes Advogados Associados esclarece que até o presente momento não teve autorizado o acesso aos autos dos processos nos quais foram deferidas as medidas cautelares impostas ao Dr. Rafael Barbosa, no bojo da cognominada “Operação dinheiro sujo”. Em momento oportuno, esclareceremos todos os fatos já vinculados pela imprensa e asseguraremos ao cliente o direito à ampla defesa e ao contraditório.
De toda sorte, há de ressaltar a estranheza das medidas cautelares impostas, seja porque o Dr. Rafael sequer foi denunciado pelo MPDFT na ação civil pública para apuração de suposto ato de improbidade administrativa relacionado aos fatos noticiados ou, ainda, porque não há efetividade na medida de busca e apreensão realizada 8 anos após os supostos ilícitos, em especial quando o mesmo juízo já deferiu, em outras 4 oportunidades, busca e apreensão em processos distintos, de forma a demonstrar a desarrazoabilidade da adoção de tal medida.
Brasília, 4 de junho de 2021.
Thyago Mendes – OAB|DF 64.705
Saulo Munhoz – OAB|DF 51.033″