Por Luís Cláudio Alves
A Câmara Legislativa do Distrito Federal debateu na tarde desta quinta-feira (2) a situação da situação mental do DF, com foco no papel do Instituto de Saúde Mental (ISM), por iniciativa dos deputados Arlete Sampaio (PT) e Fábio Felix (Psol). Os participantes apontaram diversos problemas no atendimento à saúde mental e denúncias de possíveis intervenções na área do ISM.
Ao final do encontro, Arlete Sampaio anunciou que marcará audiência com o novo secretário de Saúde, general Manoel Pafiadache, para cobrar mais atenção à saúde mental, a construção de cinco novos Centros de Atendimentos Psicossocial (CAPs) e de 10 comunidades terapêuticas.
Arlete também sugeriu a criação de um grupo de trabalho para discutir um redesenho do Instituto, buscando acabar com a casa de passagem.
A distrital lembrou a luta pela reforma psiquiátrica no Brasil, que buscava tirar as pessoas dos manicômios, considerado pelos especialistas um “tratamento desumano e destruidor de seres humanos”. Foi neste contexto, que, segundo ela, o então presidente José Sarney doou o espaço onde hoje é o Instituto, numa área nobre e privilegiada.
Na avaliação da deputada, a estrutura atual não consegue atender nem 10% da demanda por tratamento de saúde mental no DF, um quadro que se agravou com a pandemia. Para ela, é necessário reforçar a rede psicossocial, com o aumento do número de CAPs e de profissionais. Segundo ela, o DF deveria contar com 49 CAPs, mas só existem 18, o que evidenciaria um “descaso total com a saúde mental, que quer dizer descaso com as pessoas que precisam de tratamento”.
Alguns participantes relataram receio com uma possível transferência da área que abriga o ISM para a secretaria de Turismo. Luciana dos Anjos Claudino, representante dos usuários do Instituto e que faz tratamento no local há 19 anos, disse que ficou muito assustada com boatos de que a secretaria de Turismo estava querendo tomar a área, e questionou que pacientes e funcionários não foram consultados. Segundo ela, os pacientes não aceitam de forma nenhuma a transformação do Instituto em polo de turismo. Na mesma linha, a representante das famílias de pacientes manifestou indignação com o que chamou de invasão ao Instituto pela secretaria de Turismo.
Secretária desmente invasão
Vanessa Chaves de Mendonça, secretária de Turismo do GDF, participou do debate e garantiu que não há nenhuma intenção de tomar a área. Ela explicou que apenas esteve no local, “uma única vez e a convite”, para conhecer a infraestrutura, que considerou um “patrimônio fantástico”. “Podem ter certeza de que não há motivos para preocupação”, garantiu ela.
Estrada
Outra denúncia apontou para um projeto do governo de construir uma estrada cortando o espaço do Instituto. O deputado Fábio Felix (Psol) informou que a ameaça realmente existe, mas que o GDF explicou que o plano está “provisoriamente suspenso”. Na opinião do parlamentar, qualquer projeto neste sentido teria que ser debatido com o serviço que funciona naquela localidade. Felix também levantou problemas, como a falta de profissionais, necessidade de reformas físicas e condições inadequadas de atendimento aos pacientes. Para ele, os pacientes estão tendo o seu direito à tratamento prejudicado pela falta de profissionais. Acrescentou ainda que uma diligência realizada por várias entidades e pela Comissão de Direitos Humanos da CLDF encontrou várias irregularidades, que prejudicam os usuários.
Arlete Sampaio afirmou que a construção de uma estrada seria um perigo enorme para os pacientes. “Isso precisa ser definitivamente suspenso, pois configura um risco para a vida dos pacientes”. Vanessa Soublin, representante da secretaria de Saúde, confirmou a existência do projeto de uma via passando pela área, mas a área técnica teria se manifestado contrária, acrescentando que se o governo quisesse levar adiante a ideia precisaria primeiro instalar 10 comunidades terapêuticas para receber os pacientes.
O representante da Casa Civil do GDF, Maurício Carvalho, se comprometeu a fazer gestões junto à Novacap para uma definição em relação à construção da via no Instituto.
Pandemia de saúde mental
Andressa Ferrari, representante do movimento de saúde mental, assinalou que historicamente as pessoas com problemas de saúde mental sempre tiveram cerceamento de liberdade e até partes do corpo retiradas. “Não suportamos perder mais. Não suportamos perder os nossos serviços. Temos uma dívida histórica com as pessoas com problemas graves e persistentes”, completou.
Já Karina Figueiredo, presidente do Conselho Regional do Serviço Social, enfatizou que as demandas da saúde mental têm crescido de forma assustadora. De acordo com ela, estamos vivendo a “pandemia da saúde mental”, ao mesmo tempo que o atendimento tem enfrentado diversos problemas. “Sem uma vontade política de priorizar a saúde mental, não vamos avançar”, lamentou.
A presidente do Conselho Regional de Psicologia, Thessa Guimarães, classificou a casa de passagem do ISM como um verdadeiro “depósito de gente”. “O espaço é da saúde mental e precisa ser defendido, no entanto, é necessário intervir para evitar a violação de direitos e desinstitucionalizar as vidas de 30 homens e oito mulheres que se encontram na casa de passagem”, concluiu.
A deputada federal Erika Kokay (PT-DF) destacou que luta antimanicomial foi “construída com a dor do povo brasileiro, muita mobilização do povo brasileiro”. A parlamentar federal defendeu a revitalização do Instituto de Saúde Mental.
Atenção Psicossocial
O Instituto de Saúde Mental faz parte da Rede de Atenção Psicossocial do DF e está sob gestão da secretaria de Saúde desde 1987. Desde 2018, o local passou a ser uma Gerência com Serviço Residencial Terapêutico destinada a pacientes com transtorno mental grave ou persistente egressas de hospitais psiquiátricos, hospitais de custódia entre outros. A gerência também é responsável pela reinserção social de pessoas com transtorno mentais (residentes) e pela residência multidisciplinar em Saúde Mental.