“Caía a tarde feito um viaduto;(…) E um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos;(…)
Chora a nossa pátria, mãe gentil; Choram Marias e Clarices no solo do Brasil”.
Mas sei que uma dor assim pungente; Não há de ser inutilmente;
A esperança Dança na corda bamba de sombrinha; E em cada passo dessa linha; Pode se machucar;
Azar!; A esperança equilibrista; Sabe que o show de todo artista; Tem que continuar”.
Ao cair da tarde do dia 11 de julho de 2017 foi votada a reforma trabalhista com um texto de lei que se diz, em muitos pontos, ser apenas uma regulamentação de peculiaridades que já eram reconhecidos na jurisprudência e na informalidade, como sendo cotidianos nas relações de trabalho.
No show da vida, os artistas (trabalhadores), andaram na corda bamba, pois há quem diga que muitos dos pontos objetos de reforma que prejudicam claramente direitos dos trabalhadores seriam corrigidos por medidas provisórias, e isso foi objeto de crença entre os parlamentares que aceitaram açodadamente a reforma.
Aprovada a alteração da legislação trabalhista, o presidente da Câmara dos Deputados declarou que não aceitará modificações naquele texto, ainda que por Medida Provisória, contrariando promessas supostamente feitas. Aí meu amigo, choram Marias e Clarisses e todo o solo do Brasil.
Vindo para o escritório ouvi na rádio que toca notícias a pergunta feliz e satisfeita de um trabalhador ao advogado entrevistado: A contribuição sindical deixará de ser obrigatória? Como faço para não pagar?
Sou advogado há 11 anos e tenho defendido diversos sindicatos. Sou profundo conhecedor do sistema, sabedor das virtudes e das falhas. Mas doce engano dos trabalhadores que acreditam no ganho que foi a perda da obrigatoriedade do recolhimento da contribuição sindical.
Realmente existem sindicatos que não são representativos, mas cabe ao trabalhador, assim como na política, se organizar para mudar a postura sindical e política dos não representativos.
O pensamento de que houve ganho com a extinção da contribuição sindical obrigatória leva ao sufocamento de outro direito do trabalhador, o seguro desemprego e o Fundo de Amparo ao Trabalhador.
A contribuição sindical é a principal receita do sistema sindical, servindo, também, de parcela componente do Fundo de Amparo ao Trabalhador no que concerne ao quinhão ministerial/governamental, estando regulamentada na Consolidação das Leis do Trabalho, sujeita aos rigores legais.
É inegável a natureza tributária da contribuição sindical e que financia o sistema sindical. A Suprema Corte tem firmado esse entendimento em suas jurisprudências, apesar de reconhecer o caráter tributário atípico da contribuição, posto ter o Estado deixado o recolhimento do predito tributo a cargo das entidades sindicais. (RE 496456 AgR, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 30/06/2009, DJe-157 DIVULG 20-08-2009 PUBLIC 21-08-2009 EMENT VOL-02370-07 PP-01441).
A CLT, seguindo o ditame legal e dando tratamento tributário a contribuição sindical, regulamenta nos art.’s 588 e 589 que a Caixa Econômica Federal manterá conta de arrecadação da contribuição sindical e fará a distribuição dos valores, inclusive com a destinação da cota parte do Ministério do Trabalho e Emprego.
Como dito alhures, o próprio governo é beneficiário da contribuição sindical e com os valores arrecadados paga parte do seguro desemprego de muitos trabalhadores desempregados, além de utilizar os recursos para o FAT na qualificação do trabalhador.
Vejam que a comemoração do fim da obrigatoriedade da contribuição sindical é uma vitória de “Pirro”, já que o trabalhador perderá financiamento do FAT e também desestabilizará o seguro desemprego, haja vista a falta de destinação dos recursos sem mencionar a precariedade que causará aos sindicatos sem o financiamento.
Em tempos de crise, o governo faz um equivoco ao renunciar a receita vinda da contribuição sindical, tendo em vista que a grande maioria dos trabalhadores optará em não mais pagar, ainda que o valor seja tão pequeno, na maioria das vezes cerca de R$ 10,00 por mês, mas ainda sim acredita-se na vitória.
Há quem pense que os sindicatos deveriam acabar e que o modelo americano de sindicalismo livre e plural é o melhor a ser seguido. A história conta que nos países onde se abriu mão da regulamentação sindical (no caso perda da arrecadação e pluralismo) o descaminho do direito dos trabalhadores foi visto muito tardiamente.
Um exemplo simples da supressão do direito do trabalhador na aprovada legislação é que ao sindicato cabia o direito de homologação do banco de horas. Nesse momento o sindicato faz toda a diferença, pois o trabalhador pode confessar ao seu representante que não é interessante a homologação do banco de horas, todavia, com a novel legislação, a negociação de horas extras pagas em dinheiro ou em compensação será feita diretamente entre o patrão e o empregado.
Será se o país está tão amadurecido a ponto de permitir uma relação tão direta de negociação sem um intermediador? O trabalhador terá a opção de aceitar ou não um pedido do patrão de transformação de horas extras em regime de compensação?
Penso eu que precisamos avançar muito para crescer, e não é com a supressão de direitos, nem mesmo com a afirmação de que apenas está se retirando pontos da informalidade para serem regulamentados.
Na atual crise do país, o Ministério do Trabalho e Emprego perderá uma arrecadação de aproximadamente R$ 500.000.000,00 que amparava o próprio trabalhador com o seguro desemprego e precisará realocar dinheiro para cobrir o rombo. Sairá de onde o dinheiro para isso?
Sem me esquecer do bêbado e do equilibrista, o traje que lembra Carlitos, aquele que veste o preto do luto, cabe registrar que muito mais vestirá o luto o direito brasileiro com a reforma da previdência.