Por Gutemberg Fialho
A Nova Previdência – como a propaganda do governo federal está chamando a Reforma da Previdência, não tão moderna assim – tem enorme potencial para aprofundar um velho e crônico problema brasileiro: a desigualdade social. Sim, a proposta entregue pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso Nacional contém um roteiro tortuoso que ampliará exponencialmente o número de brasileiros em situação de pobreza e extrema pobreza, especialmente os idosos, fragilizados pelo tempo e, agora, ameaçados no mais elementar dos direitos: o de uma vida digna na velhice.
Reforma semelhante, feita no Chile, durante a ditadura militar de Augusto Pinochet, na década de 1980, aponta o futuro que espera o nosso trabalhador, tanto do setor público quanto do privado. Lá, além de trabalhar mais, os chilenos passaram a ver cair o valor de suas aposentadorias. Resultado: o suicídio entre idosos aumentou nos últimos anos. Para resolver esse problema, nos garante a equipe de Bolsonaro, a solução é a capitalização: sistema no qual cada trabalhador financia a própria aposentadoria por depósitos em uma conta individual. Ou seja, favorece o mercado financeiro, menos o trabalhador.
Na prática, o que fatalmente ocorre na capitalização da Previdência é que a aposentadoria do servidor público, ou mesmo do trabalhador do regime geral, que tem o teto do INSS, é investida em bancos privados. Essas instituições, por sua vez, “guardam” esse dinheiro como contribuição definida: você sabe com quanto contribui, mas não sabe com quanto se aposentará.Outro ponto não menos polêmico da reforma da Previdência proposta pelo governo federal igualmente eleva a idade mínima para aposentadoria: 62 anos para mulheres e 65 para homens.
Além disso, acaba com a aposentadoria por tempo de contribuição independentemente da idade. Para receber o benefício integral (100%), a pessoa terá que trabalhar 40 anos. Mesmo aquelas que vieram a trabalhar, ininterruptamente, dos 18 aos 58 anos não conseguirão se aposentar.É difícil encontrar, em todo o texto da reforma, o “combate aos privilégios”. Exemplo disso, vale ressaltar, é o fato de os militares não estarem incluídos no texto. Já que suas aposentadorias, como é amplamente sabido, estão entre as que mais oneram os cofres da Previdência pública. Outro ponto controverso, insistentemente falado, que cai por terra e esbarra frontalmente no discurso de “justiça” é que os servidores, em sua grande maioria, já não se aposentam com valores acima do teto.Em linhas gerais, estas são as mudanças mais substanciais da chamada Nova Previdência.
Em síntese, ela trará mais sacrifícios à população, incluindo os servidores da Saúde: como se já não padecessem o suficiente frente ao desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS).E, só para concluir, é bom lembrarmos que a CPI da Previdência, de 2017, cujo relatório final foi aprovado por unanimidade, provou não existir déficit. Inclusive, revelou haver superávit nos últimos anos. Será que, mais uma vez, seremos reféns de discursos que, no mínimo, desfiguram a realidade? É preciso mobilização para que essa reforma, necessária, porém nada combatente das “injustiças”, não seja aprovada pelo Congresso. É preciso, sim, um aprofundamento das discussões para aperfeiçoá-la e impedir a materialização de uma grande injustiça social.
Dr. Gutemberg é presidente do Sindicato dos Médicos do DF