Auditora do TCU aponta perigos na aprovação do Instituto Hospital de Base do DF pela Câmara Legislativa



Em entrevista no SindMédicoTV Luciene Pereira, auditora do TCU aponta fragilidades, armadilhas e batalhas judiciais caso deputados distritais aprovem Instituto HBDF

Por Kleber Karpov

Na noite de terça-feira (28/Mar), a TV do Sindicato dos Médicos do DF (SINDMÉDICO-DF), entrevistou a presidente da Associação da Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU), Luciene Pereira. Na entrevista, a auditora fala sobre os riscos da aprovação do Projeto de Lei (PL) 2846/2017), de autoria do Executivo, que institui o Instituto Hospital de Base do DF (IBHDF) na Câmara Legislativa do DF (CLDF) e promete uma briga junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), caso tal aprovação ocorra.

Luciene falou sobre o debate realizado, com ‘vários hospitais universitários no Brasil, para a criação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), no âmbito do governo federal. A auditora que embora se trate de um modelo diferente, a EBSERH compartilha do mesmo objetivo do IHBDF, fugir da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

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“O gestor quer ampliar a capacidade de gastos e quer também fugir do controle, dos concursos públicos que deve ser feito para que a gente tenha a meritocracia na administração pública, principalmente numa área de saúde que é uma área que tem muitos interesses políticos e econômicos.”.

Questionada sobre a diferença entre a Associação das Pioneiras Sociais (Rede Sarah) e o Hospital de Base do DF (HBDF), Luciene falou observou que o custeio de pessoal não difere tanto dos dados do HBDF e da Secretaria de Estado de Saúde do DF (SES-DF). Isso porque de acordo com a auditora, na Rede Sarah, com orçamentos de R$ 890 milhões, em 2015, e desses, 82% foram gastos para pagamento dos funcionários. Vale observar que o percentual praticamente se iguala 83% apontados pela SES-DF para pagamento de servidores na Pasta.

“Em geral os gestores apresentam essa solução, de retirar determinadas unidades importantes como o HBDF, da administração porque alega-se um gasto de pessoal, substancial, mas a Rede Sarah que é, quase que integralmente, mantida com o dinheiro do orçamento federal, também gastou em 2015, que foi o último relatório fechado com dados publicados, 82%, que é um índice maior do que a gente percebe dos dados divulgados do Hospital de Base.”, disse.

A auditora alertou para a iminência de a população do DF ficar sem acesso aos atendimentos de média e alta complexidade do HBDF. Luciene observou que a Rede Sarah foi apenas um, de vários hospitais da União, que deixou de ser gerido pela administração pública. Porém que a regra, não se aplica ao Hospital de Base.

“Se criarem esse Instituto, significa que ele não faz mais parte da administração do Distrito Federal. E o que acontece se isso for levado adiante? O que nós temos é que, na alta e média complexidade na rede distrital,  eu não vou ter mais uma atuação pública. Ou seja, eu jogo para o setor privado, a alta e média complexidade, que são procedimentos, os mais caros, e que tem o interesse econômico por trás. Por que, qual clínica não quer vender hemodiálise, tratamento de câncer para o Distrito Federal e ter uma receita certa todos os meses com os planos  de saúde passando as dificuldades que tem? É preciso ver que interesse tem por trás.”, questionou.

Luciene chamou atenção também para uma peculiaridade da Rede Sarah, não oferecer atendimento de ‘portas abertas’ – não atende em caráter de urgência e emergência. “Não é qualquer cidadão que consegue ter acesso a Rede Sarah, diferente dos hospitais que tem emergência, que atende a população do Plano Piloto e até mesmo de outros estados.”, disse ao observar a existência de muita “falácia e muito jogo”, no que tange a exploração do tema.

“Se eu jogo a alta e média complexidade onde faz o tratamento do câncer, e outras doenças que são complexas e não são de interesse do setor privado, como por exemplo a diabetes, hanseníase  e outras doenças que precisa de um especialista mas que não dá dinheiro.”, disse ao observar que cabe ao Estado assumir esse papel e recorrer à iniciativa privada, apenas em caso de saúde complementar.

CLDF

Luciene alertou ainda o perigo de os deputados distritais aprovarem a intuição do IHBDF e afirmou que se for necessário que deve recorrer ao STF para questionar uma aprovação dessa natureza por parte do Legislativo.

“Eu acredito que os distritais não vão votar esse projeto, mas se votar, certamente nós vamos ao Supremo [Tribunal Federal], para questionar, porque a media e a alta complexidade, aquilo que é mais caro para o cidadão pobre vai estar na mão do setor privado, de uma certa forma, ainda que indiretamente, e isso não é possível que a gente admita. “, disse.

Luciene reiterou a fala, durante a audiência pública na Câmara Legislativa do DF (CLDF) que discutiu o IHBDF na última semana, sobre a inexistência de falta de gestão no HBDF, mesmo diante da falta, por exemplo, de insumos, medicamentos, manutenção de equipamentos. Para a auditora, o problema está na gestão da Secretaria de Estado de Saúde do DF (SES-DF). Mesmo se levar em consideração que o GDF tem aporte de R$ 10 bilhões do Fundo Constitucional do DF (FCDF) anualmente.

“Eu diria que a falta de gestão está na Secretaria de Saúde que não faz o aporte no orçamento, de recursos necessários para esse hospital [de base] que é hospital de referencia no DF, aqui é a nossa capital, e mais a união, de uma forma diferenciada em relação a todos os estados, a união faz um aporte pelo Fundo Constitucional [do DF] de R$ 10 bilhões para manter a segurança pública e prestar auxilio de saúde e educação. Portanto o DF de uma forma diferenciada dos estados e dos municípios ainda tem uma fonte de recursos diferenciada da União. O que nós sabemos que tem sido divulgado é que o orçamento do HBDF atingiu ano passado R$ 550 milhões. E quando você compara os números de procedimentos, atendimentos, com emergências que faz uma diferença muito grande, a Rede Sarah não tem emergência aberta para a população, aqui tem, se tem um acidente grave, vai todo mundo para o hospital de base, então, com R$ 550 milhões, com todo esse atendimento, que poderia ser melhor se houvesse aporte de recursos, significa que esses profissionais estão dando o sangue pela instituição.

Fragilidade

Os perigos de um eventual contingenciamento de recursos, por parte do governo, para se atingir uma meta fiscal, também foi abordado na entrevista. Para Luciene, uma ação dessa natureza pode atingir em cheio o Instituto, caso venha a ser aprovado, por não fazerem parte da administração pública.

“Se tiver que fazer um corte, para o GDF pagar a dívida pública, ele vai primeiro cortar, primeiro essas despesas, porque o que está na administração publica ele não pode cortar porque a LRF tem um sistema de blindagem para que os serviços públicos funcionem e não fiquem refém da dívida pública, uma forma de garantir o funcionamento do serviço público, ainda mais essencial à população. Então me preocupa demais quando eu tenho serviços essenciais ao cidadão, sendo retirados da administração pública porque ele não vai fazer parte do orçamento, do limite de pessoal [LRF] eu não tenho concurso público e começam os jeitinhos nos processos seletivos, começo a indicar os apadrinhados e começo a ter um modelo de gestão que não se pautam pela meritocracia, e começo a ter um compadrio ‘quem é amigo do rei’ tem esses espaços garantidos.

Serviço Social Autônomo

A auditora falou ainda sobre o termo ‘instituto’ utilizado pela SES-DF, se trata apenas de uma “roupagem e faz parecer que é uma unidade de administração pública”, porém, de acordo com Luciene, O PL do IHBDF se trata de um “Serviço Social Autônomo [SSA], que não integra nem à administração direta, que se forma pelas secretarias e pelos fundos e nem a indireta que tem um conceito jurídico muito claro. O que compõe a administração indireta, as autarquias, as fundações, as sociedades de encomia mistas e as empresas públicas” e sugeriu uma alternativa para resolver o impasse apontado pelo governo de dar autonomia ao HBDF, porém, sem comprometer o atendimento à população.  “Criar no HBDF, ele ser no máximo uma fundação, porque aí estaria dentro da administração pública, do orçamento e com o sistema de proteção fiscal da LRF.”, disse.

Para Luciene, a criação de um SSA, não qualifica o IHBDF na condição de autarquia e tampouco de fundação, logo, ficará fora da administração pública. “É preciso ter muita clareza em relação a isso.  Em relação a algumas vantagens, que são ‘vendidas’, é óbvio que vai ter uma batalha jurídica muito grande para que não se deixe que o dinheiro do orçamento que acaba sendo mantido com o dinheiro do orçamento seja usado para pagar salário de R$ 50 mil para médicos, para diretor e etc. Quem acredita nessas ilusões é bom que fique muito claro que a gente vai lutar para que isso não aconteça e para que se observe o teto, uma vez que a fonte do recurso para uma atividade que constitucionalmente é estatal, seja considerado.”, enfatizou.

População

Segundo a auditora, a população, menos assistida economicamente, no DF será a grande prejudicada com a instituição do IHBDF. “É uma falácia dizer que o modelo como a rede Sarah, vai atender a população mais pobre que tem no HBDF, a última trincheira para o seu tratamento de saúde de alta complexidade, o tratamento do câncer, de Lúpus, dessas doenças que maltratam tanto o cidadão, e aquele mais humilde ainda. Chega a ser uma crueldade, e nos vamos lutar para que isso não siga adiante.”, afirmou ao apelar ao governador e aos deputados distritais que rejeitem na íntegra a proposta de instituição do IHBDF.

Confira na íntegra:

Transformação do HBDF em instituto prejudicaria a população

TV SindMédicoPresidente da Associação da Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU) mostra que transformar o HBDF prejudicaria a população do DF. Assista à entrevista da auditora de controle externo Lucieni Pereira. É imperdível!

Posted by SindMédico-DF on Tuesday, March 28, 2017



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