Por Jonas Valente
Passados cinco anos do início da sua vigência, a lei que instituiu prazo máximo de 60 dias para o tratamento de pacientes com câncer (Lei 12.732, de 2012) ainda não é cumprida em geral. Segundo o Ministério da Saúde, o tempo médio é de 81 dias. A informação foi apresentada em audiência pública convocada pelo Ministério Público Federal hoje (23), em Brasília, para discutir a implementação da norma.
De acordo com levantamento do Ministério da Saúde, o tempo médio se ampliou levemente desde o início da Lei. Entre 2013 e 2017, o intervalo entre o diagnóstico e o procedimento determinado para combate à doença saiu de 79 para 81 dias. As informações foram produzidas a partir de uma amostra de 500 casos analisadas pelos técnicos da pasta.
Ainda de acordo com o ministério, os tratamentos com índice maior de demora para além do prazo são os realizados para câncer de mama e de próstata. Os procedimentos com maior atraso são as cirurgias. Os estados com mais pessoas aguardando pelo tratamento após os 60 dias são Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraná. Atualmente, há 303 hospitais habilitados para atender pacientes com a doença.
O levantamento, apresentado na audiência pela coordenadora-geral de Média e Alta Complexidade do ministério, Maria Inês Gadelha, indica que, entre 2013 e 2017, o número de cirurgias de câncer subiu 29%, enquanto a quantidade de radioterapias teve aumento de 36% e o de quimioterapias, 46%. No caso dos gastos federais, as verbas destinadas a tratamentos para a enfermidade foram ampliadas em 146% no mesmo período. A gestora credita essas variações ao número maior de procedimentos realizados, mas também ao preço maior cobrado por fornecedores e prestadores de serviço.
Sistema de informação
Passados cinco anos, um dos desafios apontados na audiência ainda é o monitoramento do tempo de tratamento. O Ministério Público Federal (MPF) informou que, desde 2013, cobra do Ministério da Saúde a implantação de um sistema de gestão de informações sobre o tema. No mesmo ano, o órgão lançou o Sistema de Informação ao Câncer (Siscan). Contudo, dede então, o MPF tem identificado problemas com o programa, como dificuldades na inserção das informações.
Em 2017, o MPF procurou o ministério para apresentar as inconsistências do sistema de monitoramento. O órgão prometeu apresentar soluções aos problemas apontados nos próximos meses.
Os representantes do Ministério da Saúde na audiência pública admitiram que o Siscan ainda tem informações insuficientes. O problema estaria na alimentação das informações pelos hospitais, medida que teria sido colocada como uma nova demanda sem contrapartida aos estabelecimentos. Foi apresentado um projeto de atualização do sistema, que passaria a automatizar a alimentação de casos a partir de outras bases de dados do ministério. Contudo, não foi informado quando este começará a funcionar.
Má distribuição
Especialistas participantes da audiência indicaram desigualdades grandes nas estruturas de combate ao câncer no território brasileiro. O Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) realizou auditoria em investimentos na aquisição de equipamentos empregados em diagnósticos e identificou centralização do repasse de verbas para estados do Sul e do Sudeste.
A coordenadora-geral de Auditoria na área de saúde da CGU, Carolina Palhares, citou como exemplo o programa de renúncia fiscal para aquisição destas máquinas, cujo funcionamento favorece os hospitais que solicitam o benefício, não dando poder ao Ministério da Saúde de definir quais estabelecimentos e em quais municípios serão atendidos.
O Tribunal de Contas da União realizou avaliação da capacidade de gestão de secretarias estaduais em diversas áreas. Segundo Marcelo Chaves, representante do órgão no seminário, na atenção de média e alta complexidades (área onde são inclusas as ações de combate ao câncer), 74% dos estados foram identificados com índice de gestão em fase inicial, 26% na intermediária e nenhum na avançada.
O secretário de Saúde de Pernambuco, José Iran Júnior, pontuou que a desigualdade é ainda maior entre os municípios, muitos sem condições de realizar procedimentos de oncologia. “Diferença de uma secretaria estadual para secretarias municipais é gigante. Há dificuldade de profissionais no interior, que é coisa gritante. Temos 80% dos exames psicopatológicos ineficientes”, opinou.
Demora no diagnóstico
Na avaliação da procuradora Acácia Suassuna, um dos obstáculos ao tratamento ainda é o tempo entre a consulta e o diagnóstico. “Existem caso de pessoas que passam seis, nove meses pra ter resultado da biópsia. Quando ela consegue, [a doença] está no estágio muito avançado. Precisamos avançar na prevenção e tirar este gargalo. Isso deve ser feito cobrando dos laboratórios serviço efetivo. Se eu pago por uma biópsia, ela tem que ser entregue rapidamente”, destacou.
Fonte: Agência Brasil