Médico sugere que enfermeiro tem que limpar bunda suja. Mas após reação nas redes sociais, emite nota de retratação pública
Por Kleber Karpov
Uma decisão liminar, em favor do Conselho Federal de Medicina (CFM), concedida pela 20a Vara Federal do DF (27/09), suspendeu, aos enfermeiros, o direito de prescrever medicamento ou requisitar exames, no âmbito da enfermagem, no âmbito da Atenção Básica, prerrogativa era prevista na portaria no. 2.488/2011. O episódio, além de dividir os conselhos, também criou um clima de tensão entre médicos e enfermeiros.
Conselhos Federais
O CFM, em Nota de Esclarecimento à Sociedade (10/Out), informou que a forma como a Portaria nº 2.488/2011 tratou a atuação dos enfermeiros, causou uma “distorção ao permitir, indevidamente, aos enfermeiros a possibilidade de solicitar exames complementares, prescrever medicações e encaminhar pacientes a outros serviços”.
O Conselho apontou uma brecha para a “invasão das atribuições dos profissionais da medicina”, estabelecida pela Lei nº 12.842/2013 (Lei do Ato Médico), por deter a exclusividade dessas ações;
Segundo o CFM, uma vez que falta previsão legal na Lei nº 7.498/1986, dos enfermeiros, tal categoria deve ser subordinada a um médico assistente e alerta para o que chama de “representa mais uma tentativa de conselhos de classe e de gestores de alterarem competências de diferentes categorias por meio de resoluções ou portarias”.
O COFEN, por sua vez, também em Nota de Esclarecimento à População (12/Out), sustenta que as atribuições dos enfermeiros, na Atenção Básica “estão claramente descritas nas normas legais que regem a profissão” e observa que tais atividades são desempenhadas há mais de 20 anos”.
Para o COFEN, a Justiça tratou da questão “de forma unilaterial sem analisar a importância do trabalho do Enfermeiro na saúde da população brasileira e o quanto estão prejudicadas as ações assumidas cotidianamente pelo Enfermeiro, como o tratamento da tuberculose, da sífilis congênita, da prevenção de câncer de colo de útero, entre outras.”
Ainda para o COFEN, a alegação do CFM, em relação à exclusividade da realização dos procedimentos questinonados na Justiça, voltados à Lei do Ato Médico é equivocada pois “os artigos da Lei 12.842/13 (Lei do Ato Médico) que garantia estes procedimentos como privativos da Medicina, foram vetados pela Presidência da República”.
Excessão
Os conselhos regionais de enfermagem, repercutiram a recomendação do COFEN. Mas, no DF, por exemplo, por meio de Nota Conjunta do Conselho Regional de Enfermagem do DF (COREN-DF), a Secretaria de Estado de Saúde do DF (SES-DF) e do Sindicato dos Enfermeiros do DF (SINDENFERMEIROS-DF), a recomendação é que a categoria continue realizar exames complementares, prescrever medicações e encaminhar pacientes a outros serviços.
A SES-DF alega ter política própria de atenção primária à saúde – Portaria SES-DF 77/2017, a qual não está subordinada à antiga (Portaria 2.488/2011) ou à nova Política Nacional de Atenção Básica (Portaria 2.436/2017) publicada pelo Ministério da Saúde. A política nacional norteia a normativa distrital;
Reflexos
A briga na Justiça no entanto, cria um movimento separatista, entre profissionais das duas categorias, que pode ser percebido, sobretudo, nas redes sociais. Um dos casos, foi a declaração do médico, gastroenterologista, Cassius Frigulha, que chocou, além dos Enfermeiros, até mesmo alguns colegas da própria categoria. Na rede social, Facebook, Frigulha publicou uma postagem depreciativa em relação aos profissionais de Enfermagem, ao sugerir que têm que “limpar bosta sim”.
A reação foi imediata e reflete o pensamento do enfermeiro, Patrick M. R. Canterville. Em um vídeo postado e compartilhado por mais de 40 mil pessoas, no Facebook (11/Out), o profissional refuta as colocações de Cassius Frigulha, além de ressaltar a importância dos profissionais de enfermagem.
Antes de apagar o perfil no Facebook, Cassius Frigulha chegou a emitir uma Nota de Retratação Pública. Porém, as colocações do médico, reforçaram a mobilização dos enfermeiros. Esse é o exemplo do profissionais de enfermagem do Rio de Janeiro que agendaram uma manifestação, na manhã de segunda-feira (16/Out), em frente ao Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (CREMERJ).
Reflexões
Sobre a disputa de poder entre CFM e COFEN, são inúmeros os pontos de vistas, desabafos e acusações circulam nas redes sociais e nos círculos de discussões de profissionais de ambas as categorias.
Uma abordagem que chamou atenção de Política Distrital (PD) foi da enfermeira Anna Luisa Finkler, ao se posicionar em matéria publicada por TarobaNews (11/Out), ao lembrar que não se faz saúde sem equipe multiprofissional.
“É na hora que eu ‘limpo a bunda’ que eu faço exame físico cefalo- caudal, avaliação tegumentar, de sinais flogísticos, mudança de decúbito, higiene corporal, toque terapêutico, avaliação hidroeletrolítica, de ingestão- excreção, sistema locomotor, músculo-esquelética, nutricional…tiro dúvidas dos pacientes que perguntam: mas o que o doutor quis dizer que não entendi ou que ele não me explicou…., etc, etc, etc!! Simples assim!! Não se faz saúde nem se trata doenças sem equipe multiprofissional!!”
Mas, as reflexões, apontamentos e questionamentos apresentados pelo médico psiquiatra, Régis Eric Maia Barros, em um artigo publicado no site Stabilis Psiquiatria e Psicoterapia (11/Out), aprofundam os questionamentos a serem feitos, por conselhos, profissionais de saúde e sobretudo pela sociedade. Em uma análise imparcial, o psiquiatra traz à tona, os grandes perdedores dessa batalha.
“se criarmos entre nós, profissionais de saúde, um campo de guerra, haverá muitas mortes. Morte simbólica da nossa função de tratar aqueles quem demandam da nossa ajuda e morte real daqueles que terão um cuidado de saúde menos efetivo.”.