Instituto Hospital de Base: Bom para o DF ou jogo de cartas marcadas?



Para se tentar acabar com o caos da saúde pública do DF, aposta na melhoria do HBDF pode se tornar uma grande armadilha à Saúde do DF

Por Kleber Karpov

As cartas estão na mesa e o Projeto de Lei (PL) 1.486/2017, de autoria do Executivo, que institui o Instituto Hospital de Base do DF (IHBDF), pode ser apreciado nessa terça-feira (13/Jun), na Câmara Legislativa do DF (CLDF). O tema divide opiniões além de gerar debates que apontam, além de suposta inconstitucionalidade do PL,  a possiblidade de, os deputados distritais endossarem o início de um processo de terceirização da saúde pública do DF, sem precedentes.

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De um lado, entidades sindicais, servidores, membro do Tribunal de Contas da União (TCU), conselhos regionais de Medicina e de Enfermagem, ex-gestores e instituições ligadas à Saúde, se posicionaram contrários ao PL. Do outro, o governo, parte do ‘controle social’, representado pelo Conselho de Saúde do DF (CDSF) e, para a surpresa de muitos, o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), defendem a conversão do HBDF em instituto.

Atropelo

Um dos pontos controversos foi a rapidez com que o PL tramitou em algumas comissões da CLDF. Em manobra da base do governo na CLDF, dois dias após o governador do DF, o socialista, Rodrigo Rollemberg (PSB) encaminhar proposta à CLDF, a Comissão de Assuntos Sociais (CAS)(15/Mar) deu parecer favorável ao PL, sem quaisquer discussões aprofundadas sobre a minuta.

Na terça-feira (21/Mar), foi a vez das comissões de Economia, Orçamento e Finanças (CEOF),  Constituição e Justiça (CCJ) darem pareceres ‘relâmpagos’ ao PL. Porém ao chegar na e Educação Saúde e Cultura (CESC), o PL acabou por travar. O relator do PL, Juarezão (PSB), após uma sessão de faltas e uma tentativa de fugir à leitura do PL, por pressão dos distritais Wasny de Roure (PT), Raimundo Ribeiro (PPS), Bispo Renato Andrade (PR) e Reginaldo Veras (PDT), abandonou a Comissão para se furtar à leitura do parecer.  Porém, o presidente da CESC, Wasny de Roure ‘tomou as rédeas’ e mandou o  PL seguir para votação do Plenário. 

Cartas Marcadas I

Vale recordar que poucas horas após Rollemberg encaminhar o PL à CLDF (14/Mar), uma mensagem atribuída ao secretário da Casa Civil e Relações Institucionais e Sociais, Sérgio Sampaio, trouxe à tona uma suposta lista de apoiadores ao PL. Nela constava o nome de 16 parlamentares que supostamente votariam com o governo em relação à aprovação da instituição do IHBDF.

Embora Sampaio tenha negado a autoria, na lista distribuída no aplicativo Whatsapp, supostamente encaminhada por Sampaio, aparecem os nomes dos distritais: Bispo Renato Andrade (PR), Agaciel Maia (PR), Cristiano Araújo (PSD), Juarezão (PSB), Julio César (PRB), Liliane Roriz (PTB), Lira (PHS), Luzia de Paula (PSB), Professor Israel (PV), Professor Reginaldo Veras (PDT), Rodrigo Delmasso (Podemos), Sandra Faraj (SD), Telma Rufino (sem partido), Joe Valle (PDT), Chico Vigilante (PT), Ricardo Vale (PT).

Porém, desde então, Bispo Renato, Chico Vigilante e Ricardo Vale declararam posição contraria ao PL 1.486/2017. Reginaldo Veras que conta com o carisma dos servidores da Saúde, embora seja da base do governo, chegou a deixar claro, na tribuna da CLDF, ter recebido “uma bomba” nas mãos, ao se referir ao PL.

Derrota apertada

Nas redes sociais, uma lista produzida por entidades sindicais ligadas à Saúde do DF, apontam os posicionamentos dos parlamentares em relação ao PL. Se a previsão estiver certa, o IHBDF deverá ser rejeitado no plenário. Pois apenas seis parlamentares, votariam favorável ao governo e outros 12 contrários. Embora outros seis se mostram indecisos. Vale a pena observar que entre os deputados experientes, apenas Agaciel Maia (PR), segue com o governo.

Perigo

Essa divisão em relação ao PL do IHBDF não ocorre por um acaso. Enquanto o secretário de Estado de Saúde do DF (SES-DF), Humberto Lucena Pereira da Fonseca defende a criação de um sistema semelhate ao oferecido pela Rede Sarah Kubitschek e a facilidade no processo de gestão, do outro, especialistas apontam uma verdadeira armadilha que pode acabar com o maior hospital do DF.

Para diversos especialistas em Saúde, do Direito e do Tribunal de Contas da União (TCU) o PL 1.486/2017 foi criado para: permitir a terceirização dos serviços de Saúde, o que muitos sugerem ser uma tentativa de o governo contratar “organizações socias disfarçadas”; burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF); além da Lei das licitações, 8.666/2003 que regulamenta as Licitações;

Ex-secretários de Saúde, a exemplo de Jofran Frejat, Maria José Maninha, Arlete Sampaio, Rafael Barbosa, Elias Miziara e Fábio Gondim são extremamente críticos ao PL, assim como a gestão da Saúde conduzida por Fonseca.

Na opinião de Gondim, o governo perde uma ótima oportunidade ao deixar de valorizar o servidor, organizar a CLDF, além de tentar impor à população, sucessivos modelos de gestão que não serão eficazes a atender as demandas e resolver o problema dos moradores do DF. A presidente da Associação da Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU) e auditora do TCU, Luciene Pereira, por sua vez, alertou para a iminência de a população do DF ficar sem acesso aos atendimentos de média e alta complexidade do HBDF.

“Se criarem esse Instituto, significa que ele não faz mais parte da administração do Distrito Federal. E o que acontece se isso for levado adiante? O que nós temos é que, na alta e média complexidade na rede distrital,  eu não vou ter mais uma atuação pública. Ou seja, eu jogo para o setor privado, a alta e média complexidade, que são procedimentos, os mais caros, e que tem o interesse econômico por trás. Por que, qual clínica não quer vender hemodiálise, tratamento de câncer para o Distrito Federal e ter uma receita certa todos os meses com os planos  de saúde passando as dificuldades que tem? É preciso ver que interesse tem por trás.”, questionou.

Frankenstein

O operador de direito, Paulo Goyas, foi contundente ao referir ao PL como “Frankenstein”, ou ainda, um “projeto feito nas coxas” ao apontar diversos pontos críticos no texto do PL 1.486/2017.

Colcha de retalhos

Ao se considerar o Frankenstein, mencionado por Goyas, por analogia, parecia uma colcha de retalhos, o PL do IHBDF parece ter seguido o mesmo caminho. Enquanto tramitou nas comissões,  o projeto acumulou 30 emendas por parte dos deputados distritais.

Mas, do MPDFT…

Também causou surpresa, outra entrevista ao CB, onde o promotor do Ministério Público do DF (MPDFT), Jairo Bisol (11/Jun), se posicionou em defesa do Instituto. Bisol que em 2015 chegou a proferiu a frase: “Vamos instituir o secretário de Saúde OS, o governador como OS e todos os problemas da saúde e do DF serão resolvidos”, ao criticar o ex-secretário de Saúde, João Batista de Souza, no início das discussões sobre as OSs no DF, parece discordar da teoria que o PL do IHBDF queira abarcar “Organizações Sociais disfarçadas”.

Dessa vez Bisol foi categórico ao afirmar ser uma “solução necessária” a aprovação do PL 1.486/2017. Na avaliação do promotor, “A simples rejeição do projeto pode comprometer a imagem da Câmara e dos deputados, pois estariam negando ao governo a possibilidade de gerir a saúde e enfrentar a situação catastrófica em que ela se encontra. Seria prestar um desserviço para a cidade”, disse.

O promotor, defendeu que o parecer do MPDFT é técnico, ao mesmo tempo em que mencionou o Hospital da Criança José de Alencar (HCB) como exitoso, porém, sem mencionar que, excelência de atendimento à parte, a unidade gerida por uma OS, tem várias representações do próprio, e de outros órgãos de controles, além de uma fila de regulação, admitida pela SES-DF, de cerca de 20 mil crianças que aguardam, algumas há mais de dois anos, por tratamento no HCB.

Postura repentina?

Porém, para quem pensa que a posição de Bisol é repentina pode estar totalmente enganado. Política Distrital (PD) recebeu informações (23/Abr), de fonte que pediu sigilo da identidade, de um encontro entre o promotor e Humberto Fonseca, no início de abril.

Segundo a fonte, na ocasião do encontro, que ocoreu durante um almoço em um restaurante japonês na Asa Sul, bairro de Brasília (DF), o prato principal foi o PL 1.486/2017.  De acordo com informações recebidas, Bisol teria dito que Fonseca não deveria confiar nos parlamentares. Esse por sua vez, mencionou que voltaria a conversar com os deputados sobre o projeto.

O blog tentou contato com Bisol (23/Abr) para falar sobre o encontro e sobre a posição do promotor em relação ao IHBDF, porém, não obteve retorno.

Em causa própria

Porém, uma chateação de Bisol, em relação aos parlamentares pode ser percebida por PD em outro diálogo. Na ocasião (5/abr), o blog questionou, se uma crítica publicada em vídeo por parte de uma sindicalista, que poderia ser direcionada ao promotor, sobre o IHBDF. Na conversa, Bisol sugeriu que questionasse à protagonista do vídeo e demonstrou preocupação com o cenário da Saúde do DF, do sistema sindical e político.

“Tem gente morrendo nos hospitais – inclusive o Base – Por insuficiências dos serviços de saúde e falta de insumos. Não creio que os sindicatos desconheçam ou neguem – essa realidade, que é escancarada cotidianamente na mídia. É uma situação de ofensa aos direitos sociais e, portanto, ao interesse público. Talvez a mudança desse estado de coisas possa ofender alguns interesses corporativos… Mas até ai ela está cumprindo função sindical! Sempre que o interesse de um grupo ofender o interesse maior da coletividade haverá um conflito de posições entre os representantes desse grupo e o Ministério Público. Isso é absolutamente normal.”

Bisol também criticou o que chamou de “corporativismo” dentro do poder Legislativo. “Agora, o legislador defender interesses corporativos contra o interesse público provavelmente estará seguindo uma lógica eleitoreira oportunista que fere o princípio da representação, ou seja, não se mostra qualificado para cumprir a representação política e, portanto, está desqualificado para a democracia representativa”, disse ao observar que o mesmo princípio se aplica “a um promotor ou juiz”, concluiu.

Desmascarados

Em entrevista ao Correio Braziliense (CB) com a Presidente da Rede Sarah Kubitscheck, Lúcia Willadino Braga jogou por terra um discurso de comparação do IHBDF com a Rede Sarah, por parte do governo. Lúcia lembrou que o Sarah é um dos nove hospitais que compõem uma rede de atendimento na atenção quaternária, além de não atender emergências, ou seja, de porta fechada.

Ao ser questionada sobre a utilização do Sarah como referência de sucesso para justificar o IHBDF, Lúcia foi categórica ao afirmar ser incoerente tal afirmação. Além de observar o risco de se utilizar o HBDF como ‘cobaia’.

“Se tivéssemos sido consultados a respeito do projeto, nossa sugestão seria que um novo modelo fosse implantado em uma unidade de menor porte, em caráter piloto, e não no Hospital de Base.”, disse.



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