Lugar de policial civil é na delegacia e nas ruas, não na penitenciária



Por Alexandre Rocha

A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) possui déficit de pessoal de cerca de 50%. Mesmo assim está prestes a perder mais 500 policiais civis. Tramita no Judiciário a ação civil pública nº 2015011089140-8, ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), questionando a Lei federal nº 13.064/2014, que trata de organização de pessoal da PCDF. Essa ação pública exige que a PCDF ceda Agentes Policiais de Custódia – policiais civis – para atuarem no sistema penitenciário do Distrito Federal.

A Lei federal renomeou o cargo de Agente Penitenciário da PCDF para Agente Policial de Custódia e retirou esses policiais do sistema penitenciário. Essa lei esclarece que o Agente Policial de Custódia pertence à carreira de policial civil, portanto, com atuação na PCDF. Não obstante, o MPDFT alega que essa lei levou o sistema prisional ao caos. Ademais, a norma desconsidera que a PCDF não possui atividades penitenciárias, pois não há mais presos em delegacias.

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Por mais nobres que sejam as alegações do MPDFT, elas desconhecem a história do sistema prisional e a estrutura da PCDF. Note-se: a crise do sistema prisional do Distrito Federal se arrasta há anos, sendo decorrência de gestões amadoras, falta de investimentos físicos e humanos, e aumento vultoso da população prisional. Assim, não foi a retirada dos policiais civis do sistema prisional que agravou o problema.

Até 2005, a PCDF tinha ingerência no sistema prisional, para tanto, possuía o cargo de Agente Penitenciário destinado às execuções penais. Contudo, o contingente desses agentes da PCDF, cerca de 800, foi ficando devassado frente à crescente demanda do sistema prisional. Para piorar, o governo federal, responsável pela manutenção e organização da PCDF, não cogitava reforçar o quadro de agentes penitenciários da PCDF. A solução casuística foi a lotação de policiais e bombeiros militares e outros policiais civis (agente de polícia) nos presídios.

Para resolver definitivamente esse imbróglio, o Governo do Distrito Federal criou uma carreira própria para o sistema prisional, sendo o cargo de Técnico Penitenciário, que foi posteriormente renomeado para Agente de Atividades Penitenciárias (Leis Distritais nºs 3.669/2005 e 4.508/2010, respectivamente), com o quadro de 1.600 servidores. Nesse sentido, o sistema prisional do DF, em sintonia com o que preceitua o Ministério da Justiça e organismos internacionais, não teria mais policiais em suas dependências e contaria com uma carreira penitenciária. Com efeito, policiais civis e militares não seriam mais lotados dentro do sistema penitenciário.

Diante disso, se hoje há falta de pessoal no sistema prisional do Distrito Federal, a solução correta é contratar novos servidores penitenciários. Se isso não for viável, procede-se uma força tarefa como ocorreu outrora, com a lotação provisória de policiais e bombeiros militares e policiais civis. Mas essa solução seria temerária, porquanto não ataca definitivamente a falta de capital humano no sistema prisional.

Quanto à alegação de que a PCDF não dispõe de atividades penitenciárias, o MPDFT tem razão, mas ignora que há atividades de custódia. Embora não existam mais presos em delegacias, há na PCDF a Divisão de Controle e Custódia de Presos (DCCP) que concentra presos provisórios até que sejam encaminhados ao sistema prisional. Também há escoltas judiciais e hospitalares, recaptura de foragidos, condução de presos para audiências de custódia que estão sob a competência da PCDF. No âmbito dessa polícia judiciária, essas atividades são exercidas pelos Agentes Policiais de Custódia.

Por isso, a discutida ação do MPDFT pode trazer mais prejuízos do que benefícios. Em primeiro lugar, retrocede ao colocar novamente policiais civis dentro do sistema penitenciário. Isso contradiz uma regra básica que diz: “quem prende não pode custodiar quem está preso”. Em segundo, reduz os problemas do sistema prisional do Distrito Federal à saída dos policiais civis. Assim, exige o retorno de tais policiais, mesmo que isso seja um recurso precário. Em terceiro, a retirada dos Agentes Policiais de Custódia representa uma perda de 10% do efetivo da PCDF, o que comprometerá o bom funcionamento dessa instituição.

É fato que o sistema prisional do Distrito Federal está em crise, porém para resolvê-la não é razoável ignorar a Lei federal nº 13.064/2014. Bem como não se deve desconsiderar que o cargo Agente Policial de Custódia é do quadro da PCDF, não do sistema penitenciário que já possui carreira própria (agente de atividades penitenciárias). Ademais, não se pode buscar mitigar as mazelas do sistema prisional causando dificuldades à PCDF.

Destarte, que o MPDFT e o Judiciário – guardiões da lei – respeitem a Lei federal nº 13.064/2014, que é plenamente constitucional. Qualquer coisa fora disso é ilegal, além de pactuar com soluções casuísticas, as quais no setor público só mascaram os problemas do presente e semeiam muitos outros no futuro.

* Alexandre Rocha é policial Civil do DF, cientista político e diretor adjunto de Políticas Sindicais do Sinpol-DF


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