Ex-senador acusa Gim Argello de receber propina de empreiteiras em CPI
Polícia apura esquema na Câmara Legislativa; distrital gravou conversas
Gravações feitas na casa da deputada distrital Liliane Roriz (PTB) mostram diálogos da parlamentar com políticos citados em esquemas de corrupção no Distrito Federal. Em um trecho obtido pela TV Globo, o ex-senador Luiz Estevão e o ex-secretário-geral da Câmara Legislativa Valério Neves conversam sobre corrupção e financiamento de campanha.
As falas sugerem que o ex-senador Gim Argello (PTB), preso na operação Lava Jato, teria recebido dinheiro de empreiteiras que não queriam ser investigadas na CPI da Petrobras, no Congresso. O dinheiro teria alimentado a campanha de Liliane ou de outro participante da conversa, de acordo com o diálogo.
Luiz Estevão: Você, por exemplo, nessas eleições, você não precisou tirar dinheiro do seu bolso, tá? Foi uma situação que não se repete. Você não terá um Gim Argello, vice-presidente de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a Petrobras, em que as empreiteiras… até então, não tinha começado a Lava Jato… pagariam qualquer preço ao Gim para que ele evitasse que elas fossem convocadas para depor na CPI. Verdade, isso, ou não é? Por que que você acha que aquelas doações aconteceram?
Valério Neves: Parte do negócio.
Estevão: Faz parte do negócio.
Responsável pela defesa de Estevão e Argello em processos na Justiça, o advogado Marcelo Bessa informou que o ex-senador citado não pode responder por conversas de terceiros. Sobre Estevão, ele disse que vai se manifestar após ter acesso às gravações. A TV Globo não conseguiu contato com Valério Neves. Liliane Roriz disse que não comentará os áudios.
‘Corrupto diplomado’
Em outro trecho do diálogo, Luiz Estevão traça um “panorama” da política na capital federal. Ele afirma que “de cada cem caras, 90 são bandidos” e que ele seria o único “bandido diplomado” de Brasília. Em seguida, diz que mostraria à cidade “quantos bandidos o Brasil tem.
Estevão: Nesta cidade, de cada cem caras, tá certo? Noventa são bandidos e vivem de bandidagem, putaria e sacanagem. Vivem roubando, tomando dinheiro, cobrando comissão, entendeu? Fazendo negócio fajuto com o governo local, com o governo federal.
Agora, o que que acontece? Todo mundo é santo, a cidade só tem um bandido que é conhecido, com diploma pregado na parede. Quem é o único bandido diplomado de Brasília? Diga, pode falar o que o seu sorriso tá dizendo. Pô, e Valério, o sorriso dela tá escrito aqui e ela não fala.
Liliane Roriz: [inaudível]
Estevão: Quem é o único bandido diplomado de Brasília? Pode dizer, quem é? Luiz Estevão.
Liliane: Não fala, né?
Estevão: Bandido condenado, preso, o caralho a quatro. O que eu quero? Eu vou mostrar pra essa cidade quantos bandidos o Brasil tem, e quem são. Quem são.
Contexto
Quando a conversa foi gravada, o ex-senador Luiz Estevão cumpria pena em regime aberto. A reunião teria acontecido na casa de Liliane Roriz. Três meses depois, Valério Neves e Gim foram presos em uma das fases da operação Lava Jato.
“Você não terá um Gim Argello, vice-presidente de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a Petrobras, em que as empreiteiras… até então, não tinha começado a Lava Jato… pagariam qualquer preço ao Gim para que ele evitasse que elas fossem convocadas para depor na CPI. Verdade, isso, ou não é? Por que que você acha que aquelas doações aconteceram?” Luiz Estevão.
Ex-senador Luiz Estevão
A conversa foi entregue ao Ministério Público e encaminhada à força-tarefa da Lava Jato, em Curitiva, como uma contribuições para as investigações sobre o esquema relacionado às empreiteiras. A mesma gravação também deve ser analisada pelo MP do DF, que apura suspeitas de corrupção na Câmara Legislativa na operação Drácon.
A investigação em andamento no DF começou em agosto, motivada pelas denúncias de Liliane Roriz (PTB). Ela afirma que a presidente da Câmara, Celina Leão (PPS), articulou um esquema de pagamento de propina e desvio de recursos de emendas parlamentares que seriam usados para pagar contratos de gestão de UTIs.
Os principais alvos da operação policial são os membros afastados da Mesa Diretora: Celina Leão, o primeiro-secretário, Raimundo Ribeiro (PPS), o segundo, Júlio César (PRB), e o terceiro, Bispo Renato Andrade (PR). Também é alvo o deputado Cristiano Araújo (PSD), suspeito de articular o esquema de recebimento de propina. Todos negam envolvimento com irregularidades. Também foi alvo o computador do servidor que redigiu a emenda investigada.
Nos áudios feitos por Liliane, Celina fala sobre mudança de finalidade de uma emenda parlamentar que direcionou R$ 30 milhões da sobra orçamentária da Câmara a um grupo de seis empresas que prestam serviço de UTI. Segundo as denúncias, parte dos recursos foram repassados a deputados da Mesa Diretora.
Lava Jato
O Ministério Público Federal diz que, entre abril e dezembro de 2014, o então senador Gim Argello (PTB-DF) integrou “de modo consciente e voluntário” uma organização criminosa “que tinha por objeto a prática reiterada de crimes de cartel, fraude às licitações, corrupção ativa e passiva, lavagem de ativos no contexto da Petrobras, associando-se aos administradores das empreiteiras OAS, Odebrecht, Toyo Setal e UTC, os quais já estão denunciados ou condenados”.
De acordo com a denúncia, o ex-senador agiu “logo antes e durante a duração da CPI do Senado e da CPI Mista para praticar diversos crimes, incluindo corrupção, embaraço a investigação de organização criminosa e lavagem de ativos, visando a obstrução dos trabalhos do Estado nas investigações dos fatos relacionados à Petrobras, evitando, especialmente, convocações de empresários do grupo para prestarem esclarecimentos no Congresso Nacional”.
Fonte: G1