As acusações, apuradas pela Corregedoria da Secretaria de Saúde, vão de assédio sexual a erro médico e fraude no ponto. Sindicância comprovou que 25 servidores cometeram crimes. Caso o governador acate a denúncia, eles serão expulsos do serviço público
Por Otávio Augusto
Pelo menos 483 médicos estão sendo investigados pela Corregedoria da Secretaria de Saúde na capital federal. Os dados, obtidos com exclusividade pelo Correio, mostram ainda que 224 auxiliares de enfermagem e 70 enfermeiros são alvos de processos administrativos na pasta (leia quadro). Vinte e cinco profissionais cujos crimes estão comprovados por sindicância serão expulsos, caso o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) acate a recomendação dos responsáveis pela investigação. Os casos envolvem assédios sexuais, erros médicos, improbidade administrativa e fraudes contra o ponto eletrônico. O levantamento recolheu apurações de 2011 até janeiro de 2016. Entretanto, o panorama pode ser ainda pior. Há 461 situações que passarão por análise em mutirões. Hoje, a pasta conta com um total de 32,9 mil servidores.
A Secretaria de Saúde identificou escândalos relacionados a carga horária. Ceilândia, Samambaia, Taguatinga, Planaltina e Núcleo Bandeirante lideram o ranking de problemas, de acordo com a Corregedoria. A pasta já pagou mais de R$ 100 mil em horas extras para um único médico. Outros profissionais deveriam trabalhar 60 horas semanais nos hospitais da rede pública do DF, mas moram em outras unidades da Federação, como Rio de Janeiro e São Paulo. O Executivo local constatou que servidores burlam o ponto eletrônico de maneira que prejudicam substancialmente o funcionamento das escalas. Resultado: faltam médicos nas emergências, por exemplo.
No mês passado, um agente de portaria da Secretaria de Saúde teve a expulsão decretada no Diário Oficial do DF, após processo iniciado em 2013, para apurar a infração de acúmulo ilegal de cargos. O crime é previsto na Lei Complementar nº 840/2011, artigo 193. Desde 2006, 82 servidores, como médicos, enfermeiros e técnicos, receberam punições que resultaram em demissão, exoneração, destituição ou perda de cargo. No primeiro ano do mandato de Rollemberg, nenhum servidor da Saúde teve sanção publicada.
Fechando o cerco
O novo modelo de gestão, dividido em sete regiões, segundo o corregedor da saúde, Rogério Batista Seixas, facilita a ação do departamento. No caso de uma investigação de fraude no ponto eletrônico, por exemplo, agora ele cobra informações do superintendente, que aciona o diretor administrativo da unidade médica. “Conseguimos fazer um trabalho mais sistêmico, mais lógico e com menos possibilidade de erro. Antes, as escalas eram de papel, hoje são on-line e podemos ver, em tempo real, se o servidor está lá. Responsabilizamos a chefia imediata. Não dá para a coisa ficar solta e ninguém ser responsabilizado”, ressalta Rogério (leia Quatro perguntas para).
Atualmente, 17 advogados constituem um mutirão que analisa as denúncias que chegam à Corregedoria. Segundo Rogério, o cerco está mais apertado para aqueles que cometem iniquidades. “Antigamente, era uma coisa pulverizada, ninguém se entendia. Era uma estrutura que não funcionava”, explica. Até 2010, a Secretaria de Saúde não tinha Corregedoria. O Executivo monitorava os servidores por meio de Coordenações Disciplinares em cada unidade de saúde. “Imagina a arbitrariedade que ocorria… Se você é meu amigo, não vou abrir um processo contra você. Hoje, seguimos estritamente todos os parâmetros da lei e da Controladoria-Geral”, comenta.
Rigor
O corregedor aposta em fiscalização e controle para que o sistema se saúde seja mais eficiente e se coíbam falhas relacionadas aos servidores. Ele defende que essa é uma tarefa dos gestores da pasta e não descarta a implantação das organizações sociais (OS) para se atingir melhores índices de atendimento. “É questão de forma e conteúdo. Temos órgãos de controle no DF rigorosíssimos e que estão cada vez mais fortalecidos”, reforça, ao citar a Tribunal de Contas (TCDF), o Ministério Público (MPDFT) e a Controladoria-Geral do DF.
“Chegamos ao nível de polícia. Não temos controle das horas extras e isso tem gerado várias denúncias. Os órgãos de controle estão emprenhados em dar soluções à saúde”, destaca Rogério, ao reclamar do corporativismo extremo. “Estamos incomodando o errado. Passar a mão na cabeça não pode. Vou limpar tudo, não vai ficar nada na gaveta.” A mais recente reunião entre órgãos de controle para analisar a situação da Secretaria de Saúde ocorreu na última quarta-feira. Participaram integrantes da Corregedoria-Geral do DF, da Ouvidoria-Geral do DF, da Delegacia de Repressão a Crimes Contra a Administração Pública (Decap), entre outros representantes de organismos de fiscalização.
Quatro perguntas para
Rogério Batista Seixas, corregedor da saúde
É possível burlar um
processo da Corregedoria?
Evitamos o poder do Estado, o senhorio e o risco de cometer uma arbitrariedade. Todo processo que passa por aqui pode ser submetido ao Judiciário. Se a pessoa que foi indiciada achar algum erro, pode questionar. Se um secretário de Saúde arquivar um processo, por ser amigo de um profissional, ele responde por omissão e, como secretário, também pela de Lei de Responsabilidade e até por improbidade administrativa. O juiz não entra no mérito administrativo. Se houve um erro que contamina todos os autos capazes de violar a legalidade, ele anula todo o procedimento.
Os médicos estão
mais temerosos?
O princípio é o respeito ao servidor e preservar sua idoneidade. O servidor tem que ter o comportamento de acordo com a regra. Cobramos apenas o estrito cumprimento da regra legal de procedimento, respeitando a ampla defesa. Mas, no fim, tem um julgamento justo, de acordo com a lei. Não temos a intenção de causar temor em ninguém. A ordem aqui é a ética. Mas tem um efeito pedagógico. As minhas atitudes vão reverberando. Percebemos que estamos mudando o comportamento.
O temor da evasão dos
servidores não obriga a
Corregedoria a pegar leve?
Não. Isso é uma conduta antiética e ilegal. Não há diferença entre nós dois a partir do momento que estamos regidos pelo mesmo regime jurídico. Por isso, a responsabilidade é da chefia imediata. Por exemplo, se libero um servidor, eu me responsabilizo por isso. Se acontecer alguma coisa, ou eu coloco alguém no lugar dele ,ou faço o serviço. Os gestores serão cobrados por suas ações e de seus subordinados.
O servidor é afastado
do trabalho quando investigado?
Às vezes, um médico está sendo investigado e a sua equipe não sabe. Isso é bom que ocorra. Não é nossa intenção expor ninguém. A lei diz que, se há a tentativa de atrapalhar o processo, podemos afastar por 30 dias e ser prorrogado por mais 60. Posso afastá-lo ou colocá-lo em outro local provisoriamente.
Publicidade
Política Distrital nas redes sociais? Curta e Siga em:
YouTube | Instagram | Facebook | Twitter