Método canguru, do cuidado da gestação de risco à alta hospitalar

Programa de atenção humanizada por meio do método canguru, favorece o vínculo, estimula o aleitamento e reduz o estresse e a dor em bebês prematuros



Medo e insegurança são sentimentos que acompanham quem precisa enfrentar um parto prematuro. É um momento desafiador e que, muitas vezes, representa uma batalha pela vida. Com o objetivo de minimizar os danos físicos e psicológicos causados pelo nascimento precoce, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES) adota estratégias diferenciadas para um atendimento eficiente, como o método canguru – um plano de cuidado integral para fortalecer a saúde e o desenvolvimento dos bebês.

Jécita Pereira com o filho, Davi, que nasceu prematuro e recebeu tratamento diferenciado: “Eu estava insegura, então me orientaram a trabalhar isso na minha mente e a dizer para mim mesma que era algo bom para ele” | Foto: Arquivo pessoal

Os benefícios são vários, como favorecimento do vínculo entre mãe e filho, diminuição do tempo de separação e estímulo do aleitamento materno. “No Brasil, é uma política pública para os bebês considerados de risco, por exemplo, aqueles que passam pela unidade neonatal ou por cirurgia”, explica a fisioterapeuta Letícia Narciso, tutora do método canguru no Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib).

Com a meta de ampliar a técnica na rede pública local, a SES instituiu uma comissão inédita de promoção do método canguru para normatizar, monitorar e subsidiar as políticas e os programas de apoio a esse segmento. A iniciativa é pioneira em todo o país.

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Surpresa, batalha e superação

Quando Jécita Pereira se preparava para mais uma visita de pré-natal às 25 semanas de gestação, não imaginava que seria a última consulta. Ela recebeu o diagnóstico de diabetes gestacional e começou a sentir os primeiros sinais de que algo sairia do planejado. Em menos de 24 horas, sentindo piora nos sintomas, decidiu ir para o Hospital Regional de Samambaia, onde chegou já com 9 centímetros de dilatação.

Por conta da baixa idade gestacional, Jécita foi transferida para o Hospital Regional de Taguatinga (HRT). Apesar de a mãe ser monitorada e tomar medicações para inibir o parto, Benjamim nasceu pesando apenas 750 gramas na tarde seguinte à internação. O pequeno foi imediatamente levado à Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (Utin) e iniciou uma jornada que a mãe guarda viva na memória: “Assim que ele nasceu, me mostraram. Ele era muito pequenininho.”

Etapas do método canguru

A internação do bebê na Utin, além do diagnóstico de gravidez de risco, corresponde à primeira etapa do método canguru. A partir desse momento, é incentivado o livre acesso dos pais ao prematuro e também orientada e estimulada a participação nos cuidados. “As mães participam ativamente no toque e no diálogo, além de realizarem a extração manual do leite a ser ofertado”, detalha a fonoaudióloga e tutora do método canguru no HRT, Caroline Ribeiro.

Uma das primeiras fases do método c0nsiste em manter o bebê prematuro em contato pele a pele com a mãe ou o pai, em posição vertical

Tão logo se recuperou do parto, Jécita passou a visitar o filho a cada três horas. “Eu gostava de ir na hora de ele comer para que ele me associasse à alimentação”, conta. Benjamim se fortaleceu e os profissionais indicaram que era hora de mais um passo: aproximar mãe e filho por meio da posição canguru. Nessa etapa do método, o recém-nascido de baixo peso é mantido em contato pele a pele, na posição vertical, junto ao peito dos pais, com o auxílio de um tecido que é amarrado envolvendo o bebê e o genitor.

“Eu estava insegura, então me orientaram a trabalhar isso na minha mente e a dizer para mim mesma que era algo bom para ele”, recorda a mãe. Durante uma semana, ela recebeu suporte e apoio da equipe da Utin do HRT, que possui tutores treinados para orientar e promover o método canguru. “Fiquei tensa, com medo de deixá-lo cair, mas queria ficar o máximo possível com ele” , relata. “A felicidade em tê-lo nos meus braços foi indescritível. Chorei muito.”

Contato integral

“O contato 24 horas fortalece os laços familiares, e a mãe adquire segurança em relação aos cuidados, o que permite a alta”Caroline Ribeiro, fonoaudióloga e tutora do método canguru no Hospital Regional de Taguatinga

Depois de 57 dias, mãe e bebê foram liberados para a segunda etapa do método canguru, que corresponde aos cuidados na Unidade de Cuidados Intermediários Canguru (UcinCa). Nesse momento, os dois ficam juntos em tempo integral. Isso é possível porque essas unidades possuem infraestrutura para acolher mãe e filho no mesmo ambiente, 24 horas por dia, até a alta hospitalar.

A essa altura, Jécita se sentia cada vez mais confiante e utilizava a posição canguru com ainda mais frequência. “[O contato 24 horas] fortalece os laços familiares, e a mãe adquire segurança em relação aos cuidados, o que permite a alta”, explica Caroline Ribeiro. Foram 84 dias de internação até o início da terceira e última etapa do método canguru e uma nova vida para a família.

Nesta última fase, o bebê continua sendo acompanhado pela equipe do hospital e da unidade básica de saúde (UBS) de referência. O primeiro retorno ocorre após 48 horas da alta hospitalar, e as demais consultas são feitas, no mínimo, uma vez por semana.

O acompanhamento ambulatorial compartilhado é assegurado até o bebê alcançar o peso de 2,5 kg e 40 semanas de idade gestacional corrigida, ou seja, a contagem é feita como se o nascimento tivesse ocorrido na época esperada. “Ao atingirem este marco, os bebês são encaminhados para os ambulatórios de seguimento ou de reabilitação e para o atendimento especializado, caso necessário”, detalha a fonoaudióloga do HRT. Hoje, Benjamim – que segue ganhando peso e tem quase dois quilos – passa por avaliação semanal na sua UBS de referência.

Especialização

As equipes das unidades de neonatologia dos hospitais do DF são formadas por médicos, enfermeiros, técnicos, psicólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais. Parte desse grupo possui formação como tutor do método canguru. Atualmente, o DF conta com 48 tutores ativos.

‌Os servidores fazem cursos e oficinas de sensibilização que consideram diversos aspectos durante o cuidado do recém-nascido. “Anualmente ofertamos vários cursos para formar os profissionais que trabalham nas unidades”, aponta a fisioterapeuta e tutora Letícia Narciso. “Trabalhamos em rede, com os tutores e hospitais se ajudando. Não trabalhamos sozinhos”.

O trabalho conjunto garante um melhor desenvolvimento dos bebês. “Vários fatores contribuem para a recuperação do prematuro”, diz a coordenadora da Política de Aleitamento Materno no Distrito Federal, Mariane Borges. “ Estudos já mostram que o controle de ruídos e da luminosidade, por exemplo, interfere no desenvolvimento cerebral”.

Jécita comemora os bons resultados do tratamento: “O carinho e o amor vão além do trabalho. Os profissionais sempre me instruíram e impulsionaram. Aprendi muito com eles, perdi o medo de pegar Benjamim no colo. É um trabalho incrível, intenso e doloroso ao mesmo tempo. Inúmeras foram as vezes que chorei ali [na UTI]. Sou extremamente grata pela vida e dedicação de cada um deles”.



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FONTEAgência Brasília
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