MPF investiga casos de violência contra gestantes em hospitais do DF



Ministério Público apurou denúncia de estudante de medicina sobre práticas adotadas no Hospital Regional de Samambaia e encontrou relatos de problemas em outras unidades

Por Maria Eugênia

A investigação de denúncias de violência contra gestantes e parturientes — mulheres que estão em trabalho de parto — em maternidades e hospitais públicos do Distrito Federal motivou o Ministério Público Federal em Brasília (MPF-DF) a enviar recomendações a unidades de saúde local e ao Governo do Distrito Federal. Entre os casos apurados pelo MPF, estão ofensas verbais, proibição da presença de acompanhantes, aceleração do parto por meio de aplicação de hormônio e até mesmo a realização de procedimentos sem anestesia.

A investigação foi iniciada após o MPF receber denúncia feita por um estudante de medicina da Universidade de Brasília (UnB). O universitário relatou ter presenciado atos característicos de violência obstétrica nos atendimentos a parturientes no Hospital Regional de Samambaia (HRSam). Foram citadas práticas como a indução do parto com oxitocina — hormônio que produz contrações musculares — desde a chegada da gestante ao hospital; e realização, sem anestesia, de episiotomia — incisão efetuada na região do períneo (entre a vagina e o ânus) para ampliar o canal de parto — em todos os partos normais.

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Outro problema relatado pelo universitário é a frequente realização da manobra de Kristeller, uma técnica que consiste na aplicação de pressão na parte superior do útero com o objetivo de facilitar a saída do bebê. Essa prática é desaconselhada pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) porque pode causar lesões ao bebê e à mãe. Em alguns países do mundo, o procedimento é proibido. Ainda no HRSam, o jovem contou ter presenciado mães sendo ofendidas por funcionárias, que também proibiam a presença de acompanhantes.

Segundo constatou o MPF, na época da denúncia, em maio deste ano, o coordenador de graduação da Faculdade de Medicina da UnB, Ricardo Martins, recriminou a atitude do estudante de procurar diretamente o MPF sem antes informar a universidade. O coordenador ainda duvidou de que a denúncia tivesse sido feita por um aluno da instituição. O MPF cita declarações de Martins da época.

“Nós fomos atropelados por essa decisão. A pessoa — que nem podemos confirmar se é aluno da UnB, porque o caso corre em sigilo — tem todo o direito de prestar denúncia se viu algo que considera errado. O problema foi ter se identificado como aluno sem, ao menos, nos comunicar”, diz Martins, em trecho do documento do MPF.

Na época, o diretor do HRSam, Luciano Gomes Almeida, divulgou nota de repúdio à atitude do estudante “em termos agressivos”, segundo a Procuradoria, e os médicos da instituição chegaram a redigir uma carta de repúdio às acusações.

No entanto, o Ministério Público conseguiu confirmar as informações contidas na denúncia. Por meio de consulta a páginas do Facebook, o MPF verificou dezenas de relatos de violência obstétrica sofrida por gestantes no HRSam e em outros hospitais da rede pública do Distrito Federal, “coincidindo com o senso comum de que dar à luz em maternidades públicas brasileiras encerra alta probabilidade de submissão a diversas formas de violência física e verbal”.

Procedimentos administrativos
Na avaliação da procuradora Luciana Loureiro Oliveira, o relato levado ao MPF pelo estudante da UnB, merece a devida consideração por parte dos órgãos públicos. Por isso, a procuradora recomendou ao diretor da Faculdade de Medicina da UnB e ao diretor do HRSam que sejam instaurados imediatamente procedimentos administrativos para apurar as práticas de violência obstétrica denunciadas e os fatos relatados por pacientes no Facebook em todos os estabelecimentos de saúde utilizados pelos residentes e professores da UnB e nos da rede do Sistema Único (SUS) no DF.

A procuradora alerta, ainda, que se as autoridades públicas competentes não instaurarem a devida apuração dos fatos, elas podem responder por condescendência criminosa e ou prevaricação, ficando sujeitas às penas previstas em lei.

Já em relação à situação do aluno que foi recriminado ao fazer a denúncia, o pedido é dirigido ao corpo docente, à coordenação e à direção da Faculdade de Medicina UnB. “Os professores não devem discriminar, ameaçar ou intimidar alunos em razão de denúncia feita ao MPF ou de qualquer depoimento que venha a ocorrer pelo testemunho de más práticas médicas pelos professores”, diz o documento.

Outras recomendações
Ao secretário de Saúde do Distrito Federal, Humberto Fonseca; às diretorias do Hospital Universitário de Brasília (HUB) e do Hospital das Forças Armadas (HFA), é recomendada “que sejam adotadas as providências necessárias a fim de coibir os maus-tratos a gestantes nas dependências dos hospitais e nas maternidades públicas do DF”.

Também constam da recomendação pedidos de caráter didático sobre violência obstétrica tanto para os residentes quanto para as pacientes gestantes. Para a Faculdade de Medicina da UnB, o MPF pede que, independentemente de previsão curricular, sejam promovidas aulas e discussões sobre humanização no atendimento a mulheres durante os períodos da gestação, pré e pós-parto e pós-abortamento.

A procuradora pede, também, que os alunos sejam instruídos sobre as portarias do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Lei n° 11.108/2005, dispositivos que tratam sobre atendimento às mulheres.

Resposta da Secretaria de Saúde
Por meio de nota, a Secretaria de Saúde (SES) informou que “todas as denúncias serão apuradas e encaminhadas à Corregedoria. Se ficar comprovado qualquer tipo de erro ou lesão, todas as medidas cabíveis serão imediatamente tomadas”. Ainda de acordo com a pasta, “a rede pública já adotou mudança de cultura contida no Manual de Boas Práticas de 2010, da Organização Mundial de Saúde, que é uma referência mundial”.

A SES informa ainda que “tem promovido oficinas nas unidades de saúde com o objetivo de sensibilizar todas as equipes a adotarem as novas condutas do manual e, assim, oferecerem um tratamento mais qualificado às gestantes. Médicos e enfermeiros estão sendo capacitados para a realização dos partos, a exemplo da Casa de Partos de São Sebastião” (Com informações do MPF-DF)

Fonte: Metrópoles



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