O Ministério Público Federal (MPF) requereu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que submeta ao Plenário Virtual e que reconheça a repercussão geral de ação que discute a possibilidade de o Poder Judiciário obrigar estados e municípios a implementarem ponto eletrônico no Sistema Único de Saúde (SUS). A Procuradoria-Geral da República (PGR) defende que a matéria em discussão tem relevância política, social e econômica, além de envolver a efetiva implementação do direito fundamental à saúde e ter impacto em diversos outros processos em tramitação no país.
Na manifestação, o procurador-geral da República, Augusto Aras, ressalta a importância de que o tema seja examinado no regime da repercussão geral para conferir segurança jurídica. Segundo ele, vários municípios já vêm adotando o controle eletrônico de frequência na área da saúde, inclusive a partir de reiteradas decisões dos Tribunais de Contas dos Estados e da União afirmando a sua obrigatoriedade. Para o PGR, a medida representa gestão eficaz e transparente do SUS e está de acordo com a adoção de políticas públicas adequadas à promoção e proteção da saúde.
“A saúde, por ser indissociável do direito à vida e da dignidade da pessoa humana, possui um caráter de fundamentalidade que a inclui não apenas dentre os direitos fundamentais sociais, mas também no grupo de direitos que compõem o mínimo existencial”, argumenta Aras. “Pressupõe-se, nesses casos, a atuação positiva do Estado-garantidor, cujo dever é o de assegurar o mínimo de condições básicas para o livre desenvolvimento do indivíduo”.
De acordo com o procurador-geral, o tema ultrapassa interesses que são exclusivamente das partes do processo sob julgamento, já que a decisão repercutirá na maneira como é feito o controle de frequência dos servidores dos SUS e, por consequência, “no grau de eficiência na concretização do direito fundamental à saúde”.
Reconhecida a repercussão geral da matéria pelo STF, Augusto Aras requer nova vista aos autos para manifestação quanto ao mérito do RE nos limites do tema a ser definido pela Corte. No parecer, o PGR sugere o seguinte tema: “Definir, à luz do princípio da eficiência e do direito fundamental à saúde (arts. 37, caput, e 196, da Constituição Federal), se o Poder Judiciário detém competência para impor ao ente federado a obrigação de implementar registro eletrônico de frequência biométrico para os servidores vinculados ao SUS, bem como sistema de responsabilização dos servidores pelo descumprimento da jornada”.
Leading case
Na ação escolhida como representativa da controvérsia (leading case), o MPF processou o município de Paulista (PE) para obrigá-lo a implementar o registro biométrico de frequência dos servidores vinculados ao SUS. No processo, o MP Federal pediu ainda a adoção de um sistema de responsabilização dos profissionais que descumprirem a jornada de trabalho, a disponibilização, na internet, do local e horário de trabalho de médicos e dentistas, e a fixação de rotinas de fiscalização.
Em primeira instância, a Justiça Federal acatou apenas o pedido do MPF de disponibilização dos locais e horários de trabalho dos profissionais de saúde. Já o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) negou provimento a recurso do MPF contestando a sentença, sob a fundamentação de que as medidas requeridas representariam indevida ingerência do Judiciário em matéria de competência do Executivo, como a gestão administrativa de política pública.
O MP Federal, então, recorreu (recurso extraordinário) ao STF alegando que a ausência do ponto eletrônico e demais medidas requeridas ofendem o princípio da eficiência, previsto na Constituição, já que o sistema de fiscalização do cumprimento de jornada de trabalho no âmbito do SUS é ineficiente. No recurso, o órgão ministerial sustenta que o Judiciário é competente para impor medida ao Executivo voltada a aferir adequadamente a eficiência da máquina pública, e que não é admissível o argumento da reserva do possível e do princípio da separação dos Poderes, conforme tese do próprio STF (Tema 220).
Íntegra da manifestação no RE 1.429.728