“A Saúde no DF é hoje um caso de polícia. Há aumento assustador de mortes evitáveis” (Gutemberg Fialho, Presidente do Sindicato dos Médicos do DF)
Por Delmo Menezes
O médico e presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal, critica de forma veemente, a proposta do Executivo em implantar as Organizações Sociais, como modelo de gestão para Saúde Pública no DF.
Em entrevista exclusiva ao Agenda Capital, Gutemberg Fialho, fala da grave crise na área de Saúde Pública no DF, sobre os problemas rotineiros noticiados diariamente pela mídia, pacientes indo a óbito por falta de materiais cirúrgicos e as recentes denúncias envolvendo a cúpula do governo e gestores da Secretaria de Saúde do DF e Fazenda.
Veja entrevista completa:
AC – Presidente Gutemberg, em entrevista nesta terça-feira (19), o governador de Brasília, Rodrigo Rollemberg, declarou à imprensa que não vai recuar em relação a implantação das Organizações Sociais no DF, começando pela atenção primária na Ceilândia. Como o senhor avalia esta decisão?
Gutemberg – A atenção primária, é uma política de estado, que tem que ser gerenciada por servidores de carreira. No Distrito Federal, todos os sindicatos, associações de classe, Tribunal de Contas, Ministério Público, Defensoria Pública, dentre outros, são contra a adoção das “OSs”. Somente o governador e os empresários do setor, são a favor. Já tivemos aqui mesmo no DF, episódios envolvendo a Fundação Zerbini, o Hospital de Santa Maria administrado pela Real Espanhola, o Instituto Candango de Solidariedade, onde seus representantes estão até hoje, respondendo processos e com seus bens bloqueados.
AC – Nos últimos dias fomos surpreendidos com vazamentos de áudios pela imprensa nacional e local, em que a sindicalista Marli Rodrigues, presidente do Sindsaúde, em uma conversa informal com o vice-governador Renato Santana, faz gravíssimas denúncias de corrupção na Secretaria de Saúde e Fazenda. O que o senhor como presidente do Sindicato dos Médicos, tem a dizer sobre estas denúncias?
Gutemberg – A Marli Rodrigues traz a conhecimento da sociedade de Brasília, fatos e denúncias de corrupção sobre cobrança de propina no governo do Rodrigo Rollemberg, que é confirmado pelo vice-governador Renato Santana, ocorrendo na Secretaria da Fazenda e Saúde. Mesmo sabendo que existia denúncia de corrupção na administração direta no sistema de saúde do seu governo, o governador insiste com a política de terceirização. O que há de “podre no reino” de Rollemberg, é que ele não abre mão de uma política que tem se mostrado, como fonte de desvio de verbas e corrupção. Fica as interrogações, porque ele continua com esta prática que é contaminada com estes desvios? Quando acontecem fatos concretos de denúncias no seu próprio governo, porque ele não consegue controlar, não consegue investigar, não consegue punir?
AC – Na sua avaliação o governo errou em não ter tomado providências tão logo soube das denúncias através do vice-governador? Nos áudios que se tornaram públicos, as denúncias citam gestores que estão atuando dentro da Secretaria de Saúde.
Gutemberg – A Administração pública, tem seus procedimentos formais. Ninguém administra brincando, ou fazendo de conta que está administrando. Ninguém investiga coisas sérias com telefonemas. Deveria ter sido aberto um procedimento investigativo imediato, um pedido formal de investigação pela Controladoria do GDF. A Secretaria de Transparência foi extinta, mas tem a Controladoria. Para participar de processo de corrupção, o cidadão não precisa ser servidor, as denúncias mostram isso. Portanto o governador, mais uma vez mostrou a sua inabilidade, até para se portar como Chefe do Executivo, querendo administrar uma denúncia grave, com informalidade, e só agora que veio à tona, é que ele procura a formalidade.
AC – Nas gravações foram citadas nominalmente pessoas que fazem parte da atual gestão, como é o caso do subsecretário de logística e infraestrutura da Secretaria de Saúde, Marcelo Nóbrega. Como o senhor avalia esta situação?
Gutemberg – Nas gravações que vieram a público em uma conversa da Marli com o ex-secretário Fábio Gondim, em um trecho do áudio, diz que este cidadão, rasgou literalmente um documento de nota de empenho para compra de marca-passos. Ora, nós temos pacientes morrendo por falta de marca-passo. Nós denunciamos em fevereiro deste ano, e publicamos hoje no Correio Braziliense, a situação de uma médica da Secretaria, que numa decisão heroica, tira um marca-passo de uma paciente menos grave para tentar salvar outro, e este cidadão rasga documento de empenho para compra de marca-passo! No mínimo ele contribuiu com vários óbitos por falta deste aparelho. O governador não pode manter um cidadão desse, sem sensibilidade nenhuma, atuando de forma irresponsável no seu governo. Se este cidadão não for demitido, o governador está dando uma demonstração que é conivente com tais erros e atos insensatos dos seus assessores.
AC – Dr. Gutemberg, o senhor está pedindo a exoneração do Sr. Marcelo Nóbrega?
Gutemberg – É o mínimo que o governador pode fazer. É no mínimo um gesto que ele pode acenar, com a retomada da moralidade e do compromisso com a saúde pública do DF. Por que se este cidadão não for demitido, está cravada a imagem e a marca da irresponsabilidade e a falta de compromisso com a vida, no seu governo. O cidadão evitou a compra de marca-passo, e pessoas morreram por isso. Isto não pode passar desapercebido e o mesmo continuar na gestão, porque assim, estará contribuindo para o sofrimento de pessoas em Brasília.
AC – Alguns gestores importantes da Secretaria de Saúde, como o Dr. Walter Gaia, Superintendente da Região Leste e o Dr. Tadeu Palmieri, Diretor Geral do Base, pediram exoneração. O que afinal está acontecendo?
Gutemberg – Temos aí duas figuras importantes da medicina de Brasília e da gestão de saúde do DF. Médicos comprometidos e sindicalizados, que fazem parte do nosso círculo de amizades, o qual conhecemos profundamente. O Dr. Tadeu Palmieri, que construiu uma carreira na medicina pública e privada do Distrito Federal, muito nos honra, assim como o Dr. Walter Gaia, na atenção primária, que foi diretor do Hospital de Sobradinho, e fez um belo trabalho, coordenou e implantou a residência médica na atenção primária no DF.
“É certo que entregaram os cargos porque não conseguiram mais conviver, com a falta de habilidade, com a falta de gestão, com a falta de compromisso, com a ingerência deste governo, nas ações que são definidas na competência da direção dos hospitais”.
O Dr. Walter Gaia, não pediu demissão em vão. Houve interferência na sua gestão. Ele quis formar sua equipe, e não foi permitido. A informação que tenho, “é que o atual governo através do seu secretário de saúde Humberto Fonseca, que infelizmente tem se mostrado apenas um instrumento da vontade e da política equivocada do governador, está parecendo mais um executor de tarefas do que um formulador de políticas públicas para saúde, não permitiu que o Walter Gaia, montasse sua equipe”.
Já o Tadeu Palmieri, tem denunciado e cobrado sempre que se pronuncia na mídia, a situação precária pela qual passa o Hospital de Base. “Tem constantemente cobrado da Secretaria providências, e as respostas não vem a contento, não evoluem”. O hospital continua com problemas na cardiologia, crise na nefrologia, onde os pacientes renais crônicos necessitam fazer tratamento de hemodiálise com duração mínima de quatro horas, porém, estão ficando apenas uma hora e meia em tratamento, onde tem a sua sobrevida abreviada, por que não realizam o procedimento adequado.
AC – O senhor está dizendo que tem pacientes que podem evoluir para óbito por falta de tratamento apropriado?
Gutemberg – Faço questão que você registre. Vou dar exemplo de uma paciente que está internada no Hospital de Base, que se não for operada a tempo, inevitavelmente irá a óbito. É uma paciente que tem um tumor no “átrio”. A Secretaria de Saúde, não oferece condições para a equipe de cirurgia cardíaca. Está faltando oxigenador e não tem como fazer a circulação extra-corpórea. Esta paciente está internada a semanas no hospital, e se não for operada, vai a óbito. É mais uma morte evitável que este governo está patrocinando. Portanto o Dr. Palmieri tem denunciado e não tem escondido estas situações, tem encaminhado seus pedidos de apelo ao governo, contudo não tem tido respostas.
AC – O Sindmédico emitiu um boletim veiculado em jornal de grande circulação, onde o senhor faz uma série de denúncias, algumas até conhecidas, como falta de materiais cirúrgicos, falta de reagentes para hemogramas, falta de medicamentos comuns como dipirona, máquinas paradas de hemodiálise desde 2015, e até falta de cobertor para pacientes. Isto é falta de gestão?
Gutemberg – Acho que agora depois das denúncias feitas pela presidente do Sindsaúde, considero que nem é incompetência, e sim irresponsabilidade, falta de compromisso com a vida. Nós temos nos áudios publicados, denúncias de desvios de verbas e propina. A presidente do Sindsaúde vai ser ouvida na CPI da saúde, e deverá comprovar as denúncias que fez. Não é só falta de gestão, está aí havendo uma vontade deliberada de sucatear o sistema de saúde público, para entregar às Organizações Sociais. Se tem dinheiro para ser desviado, não tem dinheiro para comprar remédios?
Fonte: Agenda Capital