A discussão sobre a aplicação de regras concorrenciais a plataformas digitais está no centro do debate contemporâneo, exigindo análises em diversos níveis. Entre os temas emergentes estão a possível ampliação dos objetivos das leis de defesa da concorrência e o surgimento de novas teorias de dano associadas a práticas digitais.
Um aspecto importante dessa discussão é o desenho de “remédios” — intervenções por autoridades antitruste ou regulatórias — para corrigir distorções concorrenciais no ambiente digital. As autoridades de defesa da concorrência e regulatórias têm se articulado em múltiplas frentes para abrir e proteger espaços de competição.
Entre as ações que fortalecem o debate, o professor doutor Fernando Furlan, do curso de Direito do Centro Universitário UNICEPLAC, e consultor em Defesa da Concorrência, Regulação Econômica e Comércio Internacional, participou como palestrante na Conferência Internacional sobre Remédios da Concorrência na Economia Digital, realizada em Santiago de Compostela, em agosto. Durante o evento, Furlan apresentou a pesquisa “Remédios antitruste em mercados digitais: o enfoque do Brasil”, onde analisou o projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados que visa regular as Big Techs — grandes empresas de tecnologia como Google, Apple e Meta —, destacando as competências, preocupações e sugestões das autoridades de concorrência brasileiras.
A seguir, o especialista responde quatro perguntas sobre o tema:
Autoridades antitruste também podem regular as Big Techs no Brasil?
Sim, essa é a recomendação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e de diversos representantes da sociedade civil, que participaram de consulta pública organizada pelo Ministério da Fazenda. No entanto, é importante considerar as competências técnicas de órgãos como a ANPD e a ANATEL.
Como os reguladores têm buscado garantir que as Big Techs não pratiquem condutas anticompetitivas?
Até o momento, União Europeia, Reino Unido e Japão defendem um controle antitruste prévio e permanente, onde as Big Techs devem atender às demandas das autoridades de concorrência independentemente de investigações sobre condutas anticompetitivas. Esse enfoque tende a ser mais eficaz do que um controle posterior, embora a questão da segurança jurídica permaneça em discussão.
O que o Brasil pode aprender com a Digital Market Act (DMA), aprovada pela Comissão Europeia?
A necessidade de um controle prévio, capaz de prevenir e impor obrigações de proteção da concorrência nos mercados digitais, é uma lição valiosa. A União Europeia, com a DMA; o Reino Unido, com o Digital Markets, Competition and Consumers Bill (DMCC Bill); e a Alemanha, com o novo artigo 19-A da sua Lei da Concorrência, oferecem exemplos importantes.
Quais os próximos passos para o Brasil?
No Brasil, é preciso acompanhar a tramitação do Projeto de Lei 2768/22 no Congresso Nacional. Independentemente disso, o CADE já deverá adotar uma nova perspectiva ao julgar atos de concentração econômica envolvendo Big Techs e intensificar o monitoramento dessas empresas.