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22 nov 2024 03:58


Saiba como “ViraVida” pode salvar e ensinar jovens vítimas de violência sexual a sonharem

Defensoria Pública do DF é uma das parceiras do programa, ofertando estágio remunerado aos jovens

“Sou do Piauí, vim para Brasília com um ano de idade. Quando chegamos aqui (meus pais, meus dois irmãos e eu), começamos a passar por turbulências. A família veio unida, mas em alguns meses fomos despejados de onde morávamos porque não tínhamos condições de pagar o aluguel. Com isso, meu pai nos abandonou, sumiu, deixando minha mãe, os três filhos menores na rua, sem apoio, sem comida, sem nada.” Com pouco tempo de vida Vitória* encarou uma triste realidade. A única coisa que a jovem, hoje com 17 anos, se recorda desse período é “o dia em que minha mãe foi violentada por policiais para não deixar os filhos serem violentados. Nesse caso eram as meninas.”

Naquele momento, a única coisa que a garotinha queria era a presença do pai, onde pensou que encontraria conforto. “Durante esse período que a gente morou na rua, nós conhecemos pessoas que apresentaram a reciclagem para minha mãe e assim a gente conseguia dinheiro para comer. Almoçávamos, mas não jantávamos. A gente tomava café da manhã, mas não almoçava. Tínhamos que escolher a refeição que faríamos. Não dava para fazer todas”, relembra. Mas graças à reciclagem e as iniciativas governamentais, Vitória teve uma esperança: “depois dessa fase, nós conseguimos um local que foi cedido pelo governo para as famílias que se encontravam lá. Depois de um período, meu pai voltou e junto com ele trouxe as más influências. Um amigo dele veio morar com a gente e apresentou as drogas para o meu irmão. Essa mesma pessoa violentou a minha irmã e o fruto desse abuso foi o nascimento de uma criança. É difícil você conviver com a criança sabendo que ela veio ao mundo através de uma violência, de algo que você não queria.”

Depois de ter presenciado o estupro da mãe, convivido com a irmã violentada – carregando um filho oriundo do abuso – e ver o irmão perdido no mundo das drogas (e que também foi abusado sexualmente), aos 12 anos Vitória sofreu mais um trauma. “Pra mim foi tão difícil, tanto ficar em casa quanto sair porque eu fui violentada dentro de casa, no quarto da minha mãe, por um tio – uma pessoa que no momento falava que estava passando por momentos difíceis e minha família, sempre muito acolhedora, abriu as portas. Ele se achou no direito de me fazer mal. Ele fez isso em uma fase da minha vida onde eu me encontrava sozinha em todos os sentidos”.

Os dias se passaram e a adolescente viu que poderia mudar a realidade em que vivia por meio do projeto ViraVida – programa que apoia meninos e meninas, com idade entre 16 e 21 anos, que sofreram violência sexual.   “Através do ViraVida, eu e minha família aprendemos a nos apoiar. É assim que vivemos. É um ligado ao outro. Meu pai não mora com a gente, mas nós aprendemos a sobreviver sem ele. Meu irmão foi um dos primeiros a ser atendido pelo programa, foi uma mudança radical. Ele era o menino que dava dor de cabeça em todos os aspectos. Quando ele terminou o curso no ‘Vira’ falou assim para minha mãe:  ‘o programa acabou. Como a gente vai trazer dinheiro para dentro de casa? Como a gente vai conseguir sobreviver? Como vai trazer alimento?’. Minha mãe falou: ‘meu filho, o ViraVida não acabou. Ele deu uma virada para você abrir uma porta para a sua vida’. Foi quando recebemos uma ligação e o meu irmão tinha sido selecionado para fazer estágio na Defensoria Pública.”

Vitória disse que se surpreendeu positivamente com o irmão. “O local em que a gente morava era distante do lugar onde ele trabalhava. E todos os dias, vê-lo acordar 4 horas da manhã para ir trabalhar era um motivo de todos lá de casa acordar junto e falar: ‘tenha um bom dia, sua família vai estar te esperando quando você voltar’. Quando estava acabando o estágio, o chefe dele acabou contratando-o.”

De acordo com a jovem Vitória, o passado não trouxe só coisas ruins e o ViraVida foi uma dessas. “Esse projeto foi o trampolim da vida da minha família. Eu sou estagiária também da Defensoria. Minha irmã fica em casa, cuidando dos filhos e também trabalha dentro de casa. Então minha família foi reestruturada e pegou uma nova base. Deixamos a base de sofrimento e passamos a ter uma base de progresso, avanço e amor. Hoje minha vida é completa”, conta sorrindo.

Agora, a adolescente é feliz e aprendeu a sonhar. “Hoje eu tenho sonhos, eu consigo sorrir, tenho objetivos e sou motivo de orgulho, em primeiro lugar para mim mesma, depois para todos aqueles que acreditaram em mim. Não é fácil passar pelas coisas que os jovens do ViraVida passam e acreditar. O ViraVida me motivou a sair do quarto, através de uma visita que eu recebi. No dia que eles chegaram lá, eu estava deitada chorando em cima da cama. Para mim não existia nem dia e nem noite. Eu trocava o dia pela noite, minha mãe trocava junto comigo. Ela não aguentava mais ver uma menina de 12 anos deitada na cama sem expectativa de vida alguma. Minha única vontade era que tudo isso passasse e que eu morresse”.

Além de encontrar forças para levantar-se da cama, enxergar um mundo de oportunidades e aprender a sonhar, Vitória quer lutar por pessoas que passam por situações semelhantes a dela. “Hoje eu posso escrever o final da minha vida. Sou uma menina que passou por tudo isso e olha para frente, e têm objetivos a traçar. Meu sonho é trabalhar na área de Justiça, especificamente como defensora, defendendo essas pessoas”.

Conheça o projeto ViraVida e saiba como ajudar aqui.

*usado nome fictício para preservar a identidade da vítima

Fonte: DPDF

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