Seis pacientes testam positivos para HIV após transplantes com órgãos contaminados; Caso de negligência, omissão, apadrinhamento político, fatalidade?

PCS Lab Saleme, laboratório responsável por liberar órgãos contaminados para transplantes foi interditado pela Anvisa e segue sob investigações, além do órgão de fiscalização, do Ministério da Saúde, Ministério Público do RJ, Polícia Civil, Secretaria de Saúde do RJ e do Cremerj



Por Kleber Karpov

Seis pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) do Rio de Janeiro testaram positivo para HIV, após receberem transplantes de órgãos. Em comum está a liberação, por parte do laboratório Patologia Clínica Dr Saleme (PCS Lab), com sede em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, de exames dados como negativos, provenientes de amostras de dois doadores posteriormente testados soropositivos. Algo classificado como “sem precedentes”, por Cláudia Mello, secretária da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ), que confirmou que a Pasta investiga o caso.

O caso foi identificado após um paciente receber um coração, apresentar problemas neurológicos aproximadamente nove meses pós-procedimento, e ser diagnosticado com HIV. Isso, sem qualquer diagnóstico anterior da doença. Situação veio a público em reportagem da BandNews, nesta sexta-feira (11/Out), mas sob investigação desde 10 de setembro.

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Segundo Cláudia Mello, a SES-RJ transferiu todos os exames de sorologia dos doadores, da PCS Lab para o Hemorio, uma unidade de saúde estadual que deve passar a realizar os testes dos doadores. “A partir do dia 13 de setembro, toda a doação é passada direto das doações para o Hemorio”. O órgão deve realizar uma retestagem de materiais de ao menos 286 doadores que tiveram órgãos implantados em pacientes do SUS.

Investigações

Além da SES-RJ, o caso também está sob investigação da  Coordenadoria Estadual de Transplantes e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)  que interditaram o PCS Lab. Preliminarmente, conforme apresentado em reportagens do G1 Rio e TV Globo, a Anvisa, identificou a ausência de kits para realização dos exames de sangue no laboratório. A empresa, também deixou de apresentar documentos para comprovar a compra dos itens, algo a levantar a suspeita quanto a realização dos testes terem resultados eventualmente forjados.

Um inquérito civil foi instaurado pela Delegacia do Consumidor (Decon) da Polícia Civil do RJ (PCRJ) e pela 5ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Saúde da Capital, do Ministério da Saúde, Ministério Público do RJ (MPRJ), para investigar as irregularidades.  “O procedimento está sob sigilo, em razão do envolvimento de dados sensíveis dos pacientes. Assim que houver medidas a serem adotadas pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), as informações pertinentes serão repassadas à Secretaria de Saúde e à sociedade. O MPRJ ressalta que está à disposição para ouvir as famílias afetadas, receber denúncias de quem se sentir lesado e prestar atendimento individualizado às partes envolvidas”, apontou o MP por meio de nota.

O Ministério da Saúde e o Conselho Regional de Medicina do RJ (Cremerj) também devem acompanhar as investigações.

Contrato emergencia

O PCS Lab foi contratado, em outubro de 2023, ao custo de valor de R$ 9.801.008,74, por meio de processo de licitação emergencial, para prestar serviço a Fundação Saúde do Rio de Janeiro, vinculada à SES-RJ. O laboratório é responsável por realizar exames de análises clínicas e anatomia patológica na Central Estadual de Transplantes, além de atuar em ao menos 12 outras unidades de saúde estaduais, a exemplo de hospitais, institutos e centros especializados.

Em março desse ano, o laboratório teve um aporte financeiro de mais R$ 1.679.459,04, para ampliar os atendimentos a mais duas unidades de sandeu, os postos de atendimento médico de Cavalcanti e de Coelho Neto. Porém, o Portal da Transparência  do RJ aponta que a empresa, já recebeu, do Governo do Rio de Janeiro, mais de R 20 milhões, desde janeiro de 2023.

Sócios

Para além da investigação de possível negligência do laboratório, os olhares também se voltam ao quadro societário do PCS Lab, composto, por parentes do deputado federal e ex-secretário de Saúde do Rio de Janeiro, Luiz Antônio de Souza Teixeira Júnior, o Doutor Luizinho (Progressista). Matheus Sales Teoxeira Bandoli Vieira, sócio-diretor da empresa, responsável por assinar contratos com o governo, é primo de Doutor Luizinho. Walter Vieira, outro sócio do laboratório, é casado com a tia do político.

O parlamentar, chegou a emitir nota em que aponta conhecer os sócios do laboratório, e diz que espera “punição aos responsáveis, independente de quem for.

Confira a nota na íntegra:

“Conheço o Laboratório Saleme há mais de 30 anos, dirigido pelo Dr. Montano e posteriormente por seu Filho Dr Walter Viera (casado com a irmã da minha mãe Ana Paula) e suas irmãs. Lamento veementemente o ocorrido, desejando ao fim das investigações punição exemplar para os responsáveis por esses gravíssimos casos de contaminação.

Enquanto Secretário de Estado de Saúde , mantive a mesma equipe do Programa Estadual de Transplantes da gestão anterior e jamais participei da contratação deste ou de qualquer outro Laboratório.

É muito triste como um dos maiores defensores do Transplantes no País, cuja minha vida pública está marcada pela ampliação do número de transplantes no Estado, ver casos graves como esse! Espero punição aos responsáveis, independente de quem for.”

Assistência do governo federal

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou nesta sexta-feira (11/Out), que o governo deve prestar toda assistência aos pacientes infectados por HIV por conta de transplantes realizados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) no Rio de Janeiro. “Prestaremos toda a assistência a essas pessoas e a seus familiares”, disse a ministra, que reafirmou o compromisso de garantir a segurança, a efetividade e a qualidade do Sistema Nacional de Transplantes no Brasil.

“[Estou] trabalhando junto à equipe do Ministério da Saúde para todas as providências necessárias frente à grave situação adversa no estado do Rio de Janeiro envolvendo transplantes de órgãos”, garantiu a ministra em vídeo divulgado pela pasta.

Segurança

O caso, que deve seguir sob investigação em segredo de justiça, sobretudo em decorrência da sensibilidade de dados de doadores e de usuários do SUS pretende confirmar eventuais casos de negligência, omissão ou até esquemas políticos na condução dos processos de doações de órgãos, conforme lembrou a secretária de Saúde do Rio de Janeiro, não pode macular a seriedade do transplante de órgãos no país.

“Esta é uma situação sem precedentes. O serviço de transplantes no Estado do Rio de Janeiro sempre realizou um trabalho de excelência e, desde 2006, salvou as vidas de mais de 16 mil pessoas”, declarou a SES-RJ.

Leia a nota da Secretaria de Saúde na íntegra

“A Secretaria de Estado de Saúde (SES) considera o caso inadmissível. Uma comissão multidisciplinar foi criada para acolher os pacientes afetados e, imediatamente, foram tomadas medidas para garantir a segurança dos transplantados.

O laboratório privado, contratado por licitação pela Fundação Saúde para atender o programa de transplantes, teve o serviço suspenso logo após a ciência do caso e foi interditado cautelarmente. Com isso, os exames passaram a ser realizados pelo Hemorio.

A Secretaria está realizando um rastreio com a reavaliação de todas as amostras de sangue armazenadas dos doadores, a partir de dezembro de 2023, data da contratação do laboratório.

Uma sindicância foi instaurada para identificar e punir os responsáveis. Por necessidade de preservação das identidades dos doadores e transplantados, bem como do encaminhamento da sindicância, não serão divulgados detalhes das circunstâncias.

Esta é uma situação sem precedentes. O serviço de transplantes no Estado do Rio de Janeiro sempre realizou um trabalho de excelência e, desde 2006, salvou as vidas de mais de 16 mil pessoas”.

O que diz o PCS Lab

Por meio de nota, o laboratório, que atua com análises clínicas desde 1969,  afirma ter aberto sindicância interna para apurar as responsabilidades, ao que classificou de “um episódio sem precedentes”. A empresa sustenta ainda ter realizado os testes e utilizado kit de diagnósticos recomendados pelo MS.

Confia a nota na íntegra

“O laboratório PCS Lab abriu sindicância interna para apurar as responsabilidades do caso envolvendo diagnósticos de HIV em pacientes transplantados ocorridos no Estado do Rio de Janeiro. Trata-se de um episódio sem precedentes na história da empresa, que atua no mercado desde 1969.

O laboratório informou à Central Estadual de Transplantes os resultados de todos os exames de HIV realizados em amostras de sangue de doadores de órgãos entre 1º de dezembro de 2023 e 12 de setembro de 2024, período em que prestou serviços à Fundação de Saúde do Governo do Estado. Nesses procedimentos foram utilizados os kits de diagnóstico recomendados pelo Ministério da Saúde e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O PCS Lab dará suporte médico e psicológico aos pacientes infectados com HIV e seus familiares; e reitera que está à disposição das autoridades policiais, sanitárias e de classe que investigam o caso.”.

Kleber Karpov, Fenaj: 10379-DF – IFJ: BR17894
Mestrando em Comunicação Política (Universidade Católica Portuguesa/Lisboa, Portugal); Pós-Graduando em MBA Executivo em Neuromarketing (Unyleya); Pós-Graduado em Auditoria e Gestão de Serviços de Saúde (Unicesp); Extensão em Ciências Políticas por Veduca/Universidade de São Paulo (USP);Ex-secretário Municipal de Comunicação de Santo Antônio do Descoberto(GO); Foi assessor de imprensa no Senado Federal, Câmara Federal e na Câmara Legislativa do Distrito Federal.


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