Telemedicina: debate precisa ser ampliado



“A Telemedicina já é uma realidade no Brasil”. Essa foi a frase mais dita durante o II Fórum de Telemedicina, promovido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que ocorreu nesta semana. Eu estive lá e acompanhei, atentamente, boa parte das palestras. Até determinado ponto, concordo em absoluto que os avanços tecnológicos são, hoje, indissociáveis da Medicina e, portanto, a Telemedicina é, sim, uma realidade da qual não podemos fugir. No entanto, assim como a maioria dos representantes de instituições médicas presentes no encontro, acredito que a Resolução recém-aprovada pelo CFM, que autoriza consultas e procedimentos via Telemedicina, pode, ao contrário do que propõe, representar um grande atraso nas políticas de saúde no Brasil.

A primeira questão a ser abordada neste contexto é o que queremos mais adiante. Há anos, a população brasileira clama por mais investimentos em Saúde, tanto médicos quanto pacientes. Há anos, estampamos, quase que diariamente, as manchetes de jornais cobrando por mais investimentos no Sistema Único de Saúde (SUS) que é, possivelmente, uma das maiores conquistas e direitos dos brasileiros. Agora, na contramão de tudo isso, a Telemedicina, da forma como aprovada na Resolução 2.227/2018 pelo CFM, aparece como uma solução (inviável na prática) às demandas de um país que não consegue, sequer, garantir vacinas nos postos de Saúde. De que tipo de desenvolvimento (e para quem) estamos falando?

O segundo ponto que discuti e continuarei debatendo com meus colegas é: como fica a relação médico-paciente diante disso? Como funciona (ou não), na prática, uma teleconsulta e um procedimento médico? Para além das certezas que um exame de raio-x pode nos trazer, por exemplo, é preciso levar em conta, em muitas situações, as condições sociais e culturais do paciente. A Medicina é muito mais que um diagnóstico. E as evoluções que nos trouxeram até aqui não puderam desprezar a importância do contato físico entre médicos e pacientes.

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A terceira questão, que também preocupa a todos, é a provável ampliação de fraudes na Medicina. Falsos médicos, falsas clínicas e falsos diagnósticos. Quem vai controlar isso dentro de um país, como Brasil, que segue em 1º lugar na lista mundial de fraudes na internet? Além disso, é preciso salientar: a Telemedicina, como bem lembrou o deputado e médico Hiran Gonçalves durante o Fórum, tende a favorecer – e muito – as operadoras de assistência médica que, com a “facilidade” oferecida, tenderão a disponibilizar consultas para as mais diversas áreas, incluindo as mais complexas. Pergunto novamente: de que tipo de desenvolvimento (e para quem) estamos falando?

São muitas as arestas que precisam ser aparadas antes de levarmos adiante um tema tão complexo quanto a Telemedicina. Conferências entre médicos e troca de experiências online já fazem parte do nosso dia a dia. E sem problema algum. Porém, nesse prazo de 60 dias, em que as instituições médicas podem e devem ampliar o debate sobre o assunto, sugiro a todos nós, médicos e pacientes, que pensemos na possibilidade, talvez, de que teleconsultas e procedimentos à distância, sejam, na verdade, mais alguns entre os vários passos dados nos últimos anos para a precarização da Medicina e da atividade médica.



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